logofau
logocatfg
secao 4!

Cartão-Postal:

estudo e proposta de novos modelos

Marisa Toshi Nagumo

Sérgio Regis Moreira Martins

A cidade de São Paulo é retratada de forma superficial e de modo um tanto frio nos cartões-postais, sendo seu único objetivo vender uma imagem turística daquilo que a cidade não é. Os cartões-postais acabam por revelar uma cidade inexistente, que não condiz com a vivência de seus usuários. A proposta deste trabalho é produzir novos modelos de cartões-postais que sejam mais próximos de sua realidade cotidiana, no intuito de suprir certas falhas que se apresentam nos modelos comercializados atualmente. Para tanto foi necessário o estudo da evolução histórica dos cartões-postais, a realização de um ensaio fotográfico e finalmente a produção dos novos modelos.

O estudo histórico dos postais se mostra fundamental na compreensão da forma que estes se apresentam nos dias de hoje. Na Belle Époche paulistana, que durou do final do século XIX até meados dos anos 30, os cartões-postais atingiram seu ápice de consumo, era a "Idade de Ouro". Nessa época, São Paulo vivia a expansão da economia cafeeira e suas transformações na paisagem urbana, como o surgimento de novos bairros ao longo da malha ferroviária que ligava as regiões cafeicultoras com o porto de Santos, a extensão de serviços de abastecimento de água e implantação das linhas de bondes elétricos. A elite cafeeira desejosa de um manto de modernidade sobre a cidade em crescimento viu a metamorfose de uma cidade com ares provincianos em metrópole próspera, compatível com a capital federal, então a cidade do Rio de Janeiro. Uma das maiores expressões em postais foi o fotógrafo suíço Guilherme Gäensly (1843-1928), que se transfere da Bahia para São Paulo em 1890 e exerce sua atividade de fotógrafo até 1915. É um momento de grande produção dos novos palacetes, prédios públicos e novas vias, registradas através da fotografia e perpetuadas sob a forma de cartão-postal. Embora houvessem outros profissionais na área, como Vincenzo Pastore, com um foco voltado para o movimento das ruas, as imagens de Gäensly são consideradas "oficiais" da cidade.

O desenvolvimento da tecnologia gráfica permitiu o aumento da produção de postais, porém com a popularização de aparelhos eletrônicos, como a televisão e o vídeo-cassete, o interesse pelos postais diminui bastante. Na década de 1980, para contornar essa situação, por iniciativa de um empresário, os cartões-postais são comercializados em bancas de jornal e livrarias. Para não correrem o risco de a imagem se desatualizar rapidamente frente às mudanças da cidade, as imagens escolhidas para impressão são os "lugares clássicos": avenida Paulista, Pátio do Colégio, praça da Sé, entre outros lugares. Além disso, evita-se os registros de pessoas, carros e acontecimentos sociais para que não haja uma demarcação temporal. E assim, essa maneira de retratar a cidade se mantém até os dias de hoje.

A partir do conhecimento adquirido através da análise realizada na primeira etapa, parte-se para a produção de imagens fotográficas, que serão o suporte dos novos cartões-postais. Como objeto de estudo para esse ensaio fotográfico escolheu-se a avenida Paulista, considerada como um dos grandes símbolos da cidade de São Paulo e espaço muito querido entre os paulistanos. As fotografias produzidas no local têm como objetivo maior captar uma atmosfera mais íntima do espaço, retratar a correria do dia-a-dia na avenida. Todas as imagens foram realizadas com câmera tradicional, uma Canon Ftb, em filme preto-e-branco, revelados e ampliados no laboratório de Fotografia da FAUUSP. Ao contrário do que são mostradas nos cartões-postais, algumas fotografias foram tiradas na altura da barriga, assim, o fotógrafo só controla o momento do aperto do botão e avenida se revela por si mesma. Foi uma maneira de captar a essência da avenida sem muitas intervenções do fotógrafo.

Além das fotografias, os novos postais contaram com a inserção de personagens do início do século XX: Juó Bananére e Juca Pato. Juó Bananére, famoso até a década de 1930, é um personagem literário popular criado por Alexandre Machado (1892-1933), seu desenho foi dado pelo traço de Voltolino (1884-1926). Bananére é a caricatura do imigrante italiano que através de sua linguagem ítalo-macarrônica realiza críticas ferozes e bem-humoradas ao governo vigente e ao estilo de vida da época em busca de mais atenção política à população marginal, constituída por imigrantes em sua maioria. Possuía uma coluna no periódico O Pirralho, As cartas d'Abax'o Pigues, que através de seu humor brincalhão, adquire o toque de zombaria, deboche e crítica política. Seu sucesso cresce e passa a publicar O Rigalegio, ocupando uma página inteira com as mesmas seções de um jornal, só que repletos de vinhetas cômicas, caricaturas, sátiras e paródias de poemas famosos. Posteriormente, publica As cartas d'Abax'o Piques, uma publicação com oito páginas, com matérias sobre futebol, política, economia e literatura. O Diário se mantém até outubro de 1933, não resiste à morte de seu criador e encerra suas atividades. Sua importância se dá através de sua linguagem macarrônica, onde se tem pela primeira vez a oportunidade de dar voz a democracia paulista.

Juca Pato, criado por Belmonte (1896-1947), foi muito popular entre as décadas de 1930 a 1940. Diferente de Bananére, Juca é uma caricatura da classe média paulistana, essencialmente urbana. Em sua imagem se concentra a figura do homem moderno, o cidadão comum, trabalhador, honesto; no entanto, por trás de seus óculos se escondia um sujeito perplexo com a burocracia, o abuso dos impostos, a corrupção política e a exploração do povo. No intuito de criar conflitos entre diferentes épocas, percebe-se que a crítica que ambos os personagens fazem em relação à cidade mantém-se atual, colocá-los no contexto da avenida Paulista significa sobrepor as diferentes realidades urbanas. A Paulista, concebida como local exclusivo da elite paulistana no final do século XIX tem a oportunidade de receber personagens que não fizeram parte de sua realidade, mas que conviveram na mesma época, sendo esta uma característica da cidade de São Paulo, metrópole da diversidade e contradição.

 

slideshow image

If you can see this, then your browser cannot display the slideshow text.

bibliografia

topo