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secao 4!

O restauro do engenho Boa Vista

 

Sarita Carneiro Genovez

Beatriz Mugayar Kuhl

Tem-se como objeto de estudo o engenho Boa Vista, localizado a 6 km da cidade histórica de Paraty/ RJ. A partir da análise das características arquitetônicas e do seu contexto histórico, um projeto de restauro foi elaborado, com proposta de uso para o casarão e seu entorno imediato.

Os aspectos teóricos tiveram como intuito analisar o valor memorial do engenho Boa Vista, justificando a importância de se elaborar um projeto de restauro para o edifício e, principalmente, explicar a metodologia adotada nesta restauração. Era importante saber, antes de nos aprofundarmos no conhecimento do bem, se o engenho deveria realmente ser restaurado, pois nem todo edifício histórico precisa seguir os preceitos da restauração, podendo ser apenas recuperado. Conserva-se e se recupera o existente por razões econômicas de uso, enquanto se restaura por razões de cultura. A utilização de uma ou outra deve se basear no próprio objeto, no valor que a sociedade atribui ao mesmo, se ele é ou não um bem cultural.

Em seguida, foram desenvolvidas as etapas para o conhecimento do bem, que foram orientadas em duas direções: uma histórico-arquitetônica (através das fontes indiretas) e a outra mais técnica, de caráter físico-estrutural (através das fontes diretas).

Na primeira, aprofundamos argumentos como a história do edifício e os processos produtivos ali desenvolvidos. Na outra direção, estudamos a configuração métrica dos espaços, a característica intrínseca dos materiais que compõem o edifício e sua técnica construtiva, as evidências materiais que indicavam as alterações sofridas pelo bem e um preliminar diagnóstico das degradações.

A história da construção do engenho e casarão Boa Vista está relacionada com os ciclos econômicos do Brasil e a importância que a aguardente teve para a economia da região desde o século XVIII. Não foi possível precisar o ano de construção do engenho, mas algumas datas podem ser estabelecidas através da pesquisa em cartórios, livros, periódicos e entrevistas realizadas, destacando o livro que relata a história de Julia Mann, mãe do escritor alemão Thomas Mann, que morou no engenho até os seis anos de idade.

Provavelmente do final do século XVIII, o Boa Vista é um dos quatro últimos exemplares de engenho que restam em Paraty e é significativo por localizar-se próximo ao mar, sendo visível a partir da cidade. Um testemunho real e importante no que concerne à memória popular.

No entanto, a sua existência se encontra ameaçada pela falta de uso, apesar de ser uma região com grande potencial turístico. Garantiu a sua existência em grande parte por estar inserido no tombamento do Município pelo IPHAN em 1966, com inscrição no livro de Tombo de Belas Artes e no livro de Tombo Arqueológico, Etnográfico e Paisagístico.

Tudo isso torna extremamente necessário um projeto de restauro, não apenas para a manutenção e conservação de todo o construído, mas, principalmente, para adequar o edifício, tornando-o apto a receber novos usos através de soluções que respeitem a autenticidade documentaria de cada fase histórica. Essa intervenção deverá seguir, obrigatoriamente, os preceitos do restauro, que podem ser assim resumidos: distinguibilidade, mínima intervenção e reversibilidade.

O restauro crítico-conservativo foi adotado como metodologia, o que leva a uma inventiva projetual dentro dos binários histórico-crítico e histórico-técnico, garantindo a preservação do monumento, na sua integridade e autenticidade.

A definição de um novo uso para o engenho Boa Vista foi feita levando em conta suas características e exigências contemporâneas, de modo a permiti-lo desempenhar um papel articulador e impulsionador dentro de um plano que não atue isoladamente no edifício, mas que participe da regeneração da região com a instalação de atividades de apoio e serviços para aquela. (KÜHL, 2005)

Foi assim proposto um restaurante no pavimento inferior do engenho, para atender ao público em geral, e um lugar para exposições e eventos no pavimento térreo. Um Centro de Estudos ligado à rede de ensino público também seria instalado, pois seria fundamental trazer a população de Paraty para esse espaço, despertando os habitantes locais para a importância dele enquanto bem cultural.

Trabalhar com a questão da educação patrimonial e ambiental nesse projeto é muito adequado, pois o engenho, além de ser um patrimônio histórico, insere-se em um ambiente natural, com mar e matas ao redor, com diversos potenciais educativos a serem explorados.

A mínima intervenção guiou todo o desenvolvimento do projeto, assim como para as modificações visou-se a reversibilidade. Dessa forma, as novas paredes e divisórias propostas, por exemplo, são de argamassa armada, tomando sempre o cuidado de afastá-las das paredes originais.

A presença do anexo a alguns metros do antigo engenho cria um contraste entre memória e invenção. Essa proximidade, no entanto, não implicou em desrespeito, pois o novo não se destaca em relação ao velho. A nova arquitetura interage com a paisagem, estando semi enterrada, como se nascesse das rochas, mas, ao mesmo tempo, afirmando-se como invenção humana, geométrica. Natureza e obra alimentando-se mutuamente.

As atividades educacionais exigem espaços que não sejam rígidos e propiciem diferentes usos, por isso a planta é livre. O terraço será o lugar para contemplação e a partir dele os alunos poderão explorar o ambiente, com trilhas e passeios educativos morro acima.

Não se trata de adaptar um edifício a nossa necessidade presente e reduzi-lo à sensibilidade do momento atual, é mais do que isso. É elevar o conceito do significado do documento para o conhecimento do processo histórico.

Esperamos que no trabalho tenhamos conseguido aplicar as teorias e técnicas do restauro assimiladas como disciplina científica, ao tratar com a arquitetura colonial e a questão de preservação do patrimônio industrial/rural, ainda tão pouco valorizado em nosso país.

Ficha técnica

Dimensões do terreno: 700 x 368,5 x 549,35 x 425,60m
área total do terreno: 225.637,24m²
Area do projeto de intervenção: 620m²,
área construída do anexo:512m²

 

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