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secao 4!

Duas Linhas, Três Pontos.

Reconfiguração da colina central à rua Tabatinguera.

Tiago Carvalho Oakley

Alvaro Luis Puntoni

A definição do objeto deste trabalho partiu de uma pesquisa considerando inicialmente pontos de interesse na conformação da geografia da cidade. Se há um fator essencialmente determinante em toda a urbanização que reconstruiu São Paulo diversas vezes é a geomorfologia de seu território. Procurou-se também privilegiar a área central, que revela as leituras mais interessantes das sobreposições de construções do habitat humano ao longo dos três séculos e é privilegiado pela concentração da rede de infra-estruturas disponível na cidade.

Ao final do eixo da praça João Mendes, entre as ruas Tabatinguera e Conde de Sarzedas há uma área de 20.000m2 de propriedade do Governo do Estado onde estão sendo demolidas as construções periféricas para a edificação de uma torre do Tribunal do Estado. A situação do relevo do terreno é muito peculiar: sua cota principal está hoje 10m abaixo da praça João Mendes, conformado por muros de arrimo e taludes na sua periferia. A área é abraçada por três ruas e, na cota mais alta, da praça João Mendes, oferece uma bela vista para toda a várzea do rio Tamanduateí na região das baixadas do Carmo e do Glicério.

Partindo deste vazio procurou-se trabalhar uma proposta de reconfiguração ao longo da encosta da Rua Tabatinguera, considerando como recorte do projeto a área compreendida entre esta e as ruas Conde de Sarzedas e Oscar Cintra Gordinho, com limites na Praça João Mendes e no Parque D. Pedro II.

Considerando o desenvolvimento histórico de São Paulo o projeto adquire interesse como um contraponto à expansão da cidade para sudoeste. O trabalho parte de uma alternativa de ocupação da área definida considerando um olhar que se volta às antigas portas de entrada da cidade, indicando caminhos para reverter o estado de degradação de grande parte da antiga várzea do Tamanduateí.

Considerou-se como premissa a não substituição da cidade construída, buscando a proposição de estruturas arquitetônicas justapostas às existentes. A partir de um levantamento dos vazios e das construções existentes revelou-se o potencial de uma intervenção que se fizesse possível nas condições atuais. Entretanto, deveria se referenciar sobretudo nas condições geomorfológicas deste trecho de cidade, evitando restringir-se à circunstancialidade do desenho dos lotes, muitas vezes herdados da cidade de taipa. Desse modo, é uma intervenção que procura estabelecer elementos essenciais para uma organização deste território, atuando como um modelo estruturador de todas as possíveis reconstruções que a cidade naturalmente promoveria nesta região.

A área estudada situa-se como um limite claro entre a região consolidada da colina histórica, o Centro Velho, com predominância de comércio e serviços, e a região da Baixada do Glicério, com uso predominantemente habitacional e planos para recuperação de imóveis e adensamento. Seria de grande interesse, então, que esta área, localizada entre a casa e o trabalho, pudesse oferecer condições para o desfrute do ócio. Espaços que garantissem, lembrando Lefebvre, uma mudança de prática social com estratégias para aproximar o lazer da vida cotidiana, acabar com a separação "quotidianeidade-lazeres", restituir a "Festa", o lúdico. Espaços de caráter gregário que privilegiavam o convívio humano em detrimento das relações imediatas de consumo.

A configuração dos vazios sugeriu a organização da proposta. Lapidado à essencialidade, o projeto consiste em três edifícios e um percurso. Como alternativa ao programa dos tribunais, é proposto no grande vazio do terreno do Estado um centro de lazer público, que atenderia à população residente nas proximidades e todos os usuários potenciais que fazem sua jornada de trabalho no topo da colina histórica. Na cota do térreo inferior deste edifício (751.0 m) um percurso em nível, com o desenho do relevo natural, faz a ligação com o edifício articulador. Este edifício, como uma gentileza urbana, permite que sejam transpostos os 24m de desnível, servindo ao fluxo diário de milhares de pessoas entre a várzea e o patamar. É através dele que se articulam o trecho do percurso em terra com o trecho aéreo, que consiste numa estrutura elevada, um percurso na cota 735,0m que cruza a Av. do Estado e chega a um mirante no Pq D. Pedro II.

Assim, duas linhas e três pontos desenham a proposta.

Referenciada na cidade existente mas considerando a potencial reconfiguração dos edifícios convenientes, nossa proposta desenha os dois lados de um triângulo que se completaria com a reorganização natural das edificações da rua Tabatinguera. Assim, a partir do trabalho com um vazio existente no interior da quadra construímos uma referência organizadora para construção de sua periferia.

No horizonte atual em que é cada vez mais difícil imaginar projetos globais de reedificação das cidades a várzea do tamanduateí se apresenta como uma reserva potencial de espaços de memória industrial ociosos, um eixo composto de grandes propriedades, com perspectivas de criação de espaços e equipamentos públicos generosos e novas formas de habitar esta cidade. Seria interessante imaginar como cada eixo transversal a este grande vazio poderia relacionar a cidade alta, consolidada, com a cidade baixa, na várzea por se reconstruir. Desse modo, este trabalho pode ser entendido, nesse contexto mais abrangente, como um estudo de caso, uma maneira de trabalhar um trecho de cidade que poderia ser reestudada ao longo de toda a borda leste da colina histórica e do espigão rumo a sudoeste.

 

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