O presente trabalho final de graduação tem como objetivo a elaboração de uma proposta de intervenção em edifício do conjunto industrial localizado nas Ruas Joly, Sampson, Euclides da Cunha e Manoel Victorino, no bairro do Brás, São Paulo. Apesar de estarem listados como ZEPEC (Zonas Especiais de Preservação Cultural), os imóveis ainda não são tombados.
O conjunto fazia parte da antiga Tecelagem de Seda Ítalo-Brasileira, cujas referências mais antigas remontam ao início do século XX e estão ligadas ao industrial Rodolfo Crespi. Posteriormente, na década de 1930, o conjunto foi vendido para as Indústrias Reunidas Francisco Matarazzo, cujo escritório ainda permanece num dos lotes do conjunto.
A escolha deste conjunto levou em conta não só seu reconhecimento como construção arquitetônica representativa de um determinado período e do desenvolvimento industrial ocorrido no bairro, como também a significação que este bem material dotado de relevante valor histórico e simbólico tem para a comunidade, ou seja, a memória que será preservada com ele.
Para a caracterização do espaço em que o edifício está inserido, foram realizados levantamentos históricos e iconográficos do bairro, e breve análise do seu processo de urbanização, marcada pela atividade industrial e pela presença da classe operária composta predominantemente por imigrantes italianos, nas décadas de 1910 a 1930; pelo esvaziamento populacional a partir da década de 1930/1940 e pela ocupação mais recente de imigrantes coreanos e bolivianos.
Após a definição deste conjunto industrial para estudo, procurou-se aprofundar as pesquisas históricas e iconográficas, as análises construtivas e do estado de conservação. Foram realizados levantamentos métricos da fachada, e levantamentos fotográficos nas áreas em que o acesso foi possível.
Com o objetivo de identificar as potencialidades da área e um novo uso possível para o conjunto, foi realizado um diagnóstico da região, incluindo análise do sistema viário existente, do uso e ocupação das áreas adjacentes ao edifício escolhido. Entende-se que a definição do uso é uma das questões mais importantes nos projetos de preservação e conservação do patrimônio cultural.
A partir do diagnóstico realizado, e da análise da estrutura física dos edifícios em estudo, idealizou-se como proposta de uso a implantação de uma escola de moda com cursos que atendessem não só à população local, aos trabalhadores da região, como também aos sacoleiros, comerciantes e empresários que vêm de outras regiões do estado e muitas vezes passam alguns dias na capital. Desta forma, o uso proposto explora o potencial que a região tem para atrair pessoas de outras localidades.
Considerou-se que o uso escolar seria facilmente adaptável a um dos edifícios do conjunto, possibilitando a elaboração de um projeto que respeite e valorize os princípios arquitetônicos do edifício, assegurando sua preservação.
Dada a grande extensão do conjunto, que atualmente está fragmentado em lotes de diferentes proprietários, a proposta de intervenção foi desenvolvida para apenas um dos edifícios da antiga Tecelagem de Seda.
Após a análise do histórico do edifício e das transformações sofridas por ele ao longo dos anos, conseguiu-se estabelecer uma hierarquia de valores das características da construção.
Observou-se que nas diferentes fases da edificação a estrutura foi utilizada conforme as necessidades do momento, fragmentando o espaço ou utilizando-o para amplas instalações. O que permaneceu, em geral, foi a modulação dos pilares, da fachada, e da cobertura.
São estes três elementos que se julgou ter maior importância na configuração do edifício e que seriam priorizados para preservação. Eles compõem a ossatura da construção: pilares que sustentam a estrutura da cobertura e cujos distanciamentos ditam o ritmo das fachadas marcadas pelas pilastras salientes e envasaduras.
A primeira premissa para distribuição dos usos no edifício foi a utilização do térreo para abrigar as dependências que necessitavam de maiores áreas e para as de caráter mais público. Outras das premissas para este pavimento eram a manutenção de amplos corredores paralelos às ruas, permitindo a visualização do edifício em suas grandes extensões; e a proposta de criação de uma área livre sob a cobertura metálica diferenciada, na área central do edifício, para onde convergiriam vários usos da escola.
A configuração final do térreo contempla biblioteca, área de exposição, restaurante, café, livraria, auditório, ateliê de vitrinismo, oficina de costura e loja dos alunos, salas de corte manual e computadorizado. Foram criados mezaninos sobre banheiros e salas de menor porte, que não necessitavam do pé-direito total do térreo (5,50m), para abrigar as salas de mecânica de máquina de costura, escritório piloto, vestiários e copa dos funcionários e salas de estudo e de vídeo dentro da biblioteca.
O pavimento superior abrigará as salas de aula menores - convencionais, de modelagem convencional e computadorizada - e toda a parte administrativa.
Ao invés de criar uma estrutura que se sobressaísse em relação ao construído, optou-se por criar blocos dentro da estrutura existente, utilizando o espaço livre sem desconsiderar a configuração do ambiente.
Ainda que o projeto arquitetônico em si não tenha sido profundamente desenvolvido em seus detalhes - até mesmo pela falta de dados que possuíamos do existente - espera-se que a proposta tenha explicitado o partido, a intenção do projeto.
O que se pretende, sobretudo, é desvendar o edifício fabril existente, revelando e transmitindo às gerações futuras suas características mais interessantes, a espacialidade e a versatilidade de uma edificação construída para abrigar um programa industrial do começo do século XIX.
A pesquisa histórica e a análise do conjunto escolhido não é somente etapa obrigatória de conhecimento do objeto em estudo. É, também, instrumento fundamental para a preservação da memória deste patrimônio industrial, pois a divulgação dos dados pesquisados já é, por si só, um ato de preservação daquilo de intangível e imaterial que o edifício possui.
