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secao 4!

Lazer flutuante na billings

 

Ana Carolina Ayres Gimenez

Jose Tavares Correia de Lira

Este trabalho nasceu da vontade de um grupo de amigos de enfrentar a questão da industrialização da construção no projeto de arquitetura. Animados em desenvolver um projeto para o concurso de pré-fabricados em 2005, nos colocamos, como alunos da FAU, o desafio de desenvolver um sistema construtivo que através da reprodutibilidade, da padronização e da grande escala pudesse responder à alguma das inúmeras demandas da cidade.

A herança da vertente moderna da crença na industrialização da construção com a perspectiva de produzir avanço nas estruturas produtivas ainda produz ecos na nossa escola. Para nós, naquele momento, desenvolver um sistema construtivo que pensasse uma maior integração entre indústria e construção significava desenvolver um projeto que contribuísse para repensar o canteiro tradicional e refletir sobre uma escala da produção material da arquitetura capaz de enfrentar os problemas urbanos atuais.

De maneira quase intuitiva nos debruçamos sobre a represa Billings, seja pela diversidade de abordagens possíveis, seja pela natureza metropolitana dessa imensa massa d'água, que fatalmente introduz a necessidade de enfrentamento naquela escala, qualquer que fosse o programa.

Optamos por desenvolver, utilizando processos mais racionalizados de produção, equipamentos flutuantes que tivessem uma mobilidade tal, que pudessem ser implantados numa diversidade de situações refletindo dessa maneira a complexidade e heterogeneidade de ocupação das margens da represa. O programa de lazer nasceu da idéia de retomar a Billings como a "praia" de São Paulo, imagem freqüente no imaginário dos paulistanos, mas que não se realiza em projetos sensíveis a essa forma de apropriação. O projeto infelizmente foi abandonado, mas ressurgiu aqui com a preocupação de retomar suas margens e águas como lugares públicos por excelência.

Os equipamentos flutuantes por outro lado nos levaram a pensar o programa de lazer de uma maneira menos estanque, menos confinada a clubes fechados, Iate clubes e clubes de Vela, alternativas exclusivistas e elitistas que foram, ao longo dos anos, a maneira dominante de realização do lazer nas represas.

À medida que me debruçava sobre a história de construção e operação da represa, mais ficavam claras outras dimensões, ainda mais perversas, das formas como rios e represas foram transformados, o grau de tecnicização que sofreram esses espaços antes dedicados às práticas coletivas de lazer e reprodução material e cultural da vida. O mesmo rio Tietê que em 1924 era palco da travessia de São Paulo a nado, hoje tem por função escoar o esgoto da cidade e estruturar a circulação metropolitana, funções desempenhadas de modo altamente problemático.

A represa não escapou a essa tecnicização: nasce do projeto de geração de energia na Usina de Cubatão. Se hoje, ao visitá-la e navegar por suas águas identificamos aqui e ali fraturas nessa apropriação técnica de suas águas, constituindo possibilidades efetivas de apropriação coletiva dos seus espaços, hegemonicamente ela é vista em sua função técnica de infra-estrutura metropolitana, para produção de água e energia elétrica. Num emaranhado ideológico que coloca entre dois pólos a necessidade de preservação de suas águas ? para produção hídrica e por preocupação "ambiental" ? e a necessidade de aumento de produção de energia com a retomada da reversão do Pinheiros, sobra pouco espaço para discutir a vivência da represa em sua dimensão coletiva, recreativa, integradora. Não se trata aqui de cair na armadilha de entrar em um dos pólos de conflito, mas sim de repensar o lugar da represa para os moradores da Região Metropolitana de São Paulo.

Os reservatórios possibilitam uma gama enorme de projetos ligados ao lazer. O percurso adotado para definir melhor um programa de usos cabível para a diversidade de situações encontradas na represa foi, em primeiro lugar, fazer uma aproximação histórica de algumas questões que consideramos relevantes abordar. Sem a pretensão de encerrar o assunto, investigamos o papel estrutural que a represa teve nos processos de expansão urbana como uma das protagonistas na formação do capital produtivo necessário ao desenvolvimento urbano industrial da região metropolitana de São Paulo. Na tentativa de complementar essa investigação, procuramos entender quais mecanismos de crescimento urbano resultaram na configuração atual da represa como lugar de habitação sem que suas margens tenham sido incorporadas à cidade propriamente dita, sem que tenham passado por um processo de urbanização compatível com a densidade e a taxa de crescimento dos bairros às suas margens . Com isso, investigamos a situação dessas bordas onde se amontoam pessoas vivendo mal e buscando comida, trabalho, existência, nas vizinhanças.

Uma segunda aproximação tratou de definir melhor os espaços existentes na Billings hoje. A dimensão total da lâmina d'água, aproximadamente 10.000 hectares ou 100 km², inviabiliza que nos detenhamos em cada um dos seus espaços. Assim, além de navegar por suas águas, conversar com moradores, fazer visitas a uma diversidade de lugares, procuramos complementar a caracterização da área recorrendo a fontes bibliográficas. Essa segunda aproximação nos deu subsídios para escolher as áreas mais propícias para utilização dos equipamentos de lazer.

A represa é, majoritariamente, uma zona de trânsito. Trânsito das águas em direção a Cubatão, de mercadorias que vêm e vão do porto de Santos, das águas que abastecem o ABC, dos oleodutos que passam pelas margens e sobem a serra para abastecer os centros consumidores. É através de seu território que se estabelecem relações funcionais entre São Paulo e Santos que imprimem a um só tempo a característica de intermediação e separação entre as metrópoles. Duas ferrovias, duas rodovias e um anel rodoviário em construção. Uma zona de passagem. Mas quais outras dimensões pode ter a represa?

As investigações procuram apontar caminhos para um ensaio de projeto de lazer para a Billings, evidentemente sem encerrar o assunto. Partimos de um olhar distanciado, para entender na escala da metrópole de São Paulo quais conexões necessárias, quais articulações possíveis para concretizar o lazer em escala metropolitana. Em seguida elegemos 4 situações que procuram abordar as dinâmicas presentes nas margens da represa: as margens densamente e precariamente ocupadas do braço Cocaia, a barragem de pedreira, a travessia do rodoanel no corpo principal da Billings e a Prainha de São Bernardo do Campo. Finalmente nos detivemos no "porto-praia-estaleiro" na barragem de pedreira, embrião do projeto de lazer para a Billings e fundamental para a existência do programa, que articulado a outras situações, procura se constituir como um sistema de equipamentos públicos de lazer para a Grande São Paulo.

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