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secao 4!

MASP:

MUSEU DE ARTE PARA A METRÓPOLE

Régis Yassuda Sugaya

Luciano Migliaccio

Quando, em 1946, Lina Bo e Pietro Bardi partem da Itália em direção ao Brasil trazendo seus pertences no porão de um navio, carregam também a expectativa de uma nova vida, não apenas por se fixarem em outro país, mas por acreditar que este país se faria novo. Dessa forma, esperavam participar do processo de invenção de um Brasil moderno, encontrando em sua natureza e em seu povo a vocação para criar uma sociedade nova e autônoma, uma vez que na Europa, nem mesmo a devastação da guerra parecia capaz de suplantar velhas posições.

Pouco tempo depois, a oportunidade de atuar no campo da cultura brasileira surgiria na forma de um museu de arte. Lina e Pietro, que na Itália militavam pela arquitetura racionalista, tomaram como primeira iniciativa, à frente do Masp, a oposição ao modelo museológico tradicional Europeu.

Conceberam um museu "fora dos limites" e se lançaram no desafio de encontrar uma linha de continuidade entre o espólio artístico da história humana e a nova cultura, a ser construída no contato direto com a realidade existente no Brasil. Procuraram diversos canais de ligação com a sociedade, com os setores produtivos, as classes artísticas, a intelectualidade e os poderosos, mas sobretudo com os protagonistas na formação da cultura de um país democrático: seu povo, a quem dedicaram o museu e suas atividades didáticas.

Acompanham atentos o processo de industrialização brasileira, etapa essencial à formação da sociedade moderna, e ao novo papel que a arte deveria exercer neste contexto em que a integração tradicional entre produção estética e modos de vida será suplantada pelo produto em série. No entanto, acreditam na possibilidade de humanizar, pela arte, esta transição para a indústria, em consonância com as manifestações vivas da cultura local. Procuram uma atuação próxima ao universo material da produção e do trabalho, criando um museu-escola para formar os projetistas dos objetos da cultura industrial, e militam pela formação dos gostos e das formas de viver sob uma condição moderna.

Assim, buscam promover uma relação com a obra de arte avessa, tanto ao idealismo do resgate histórico que cria cenografias para contextualizar a obra, quanto ao mito, também idealista, da transcendência da obra de arte exibida à parte do contexto pairando acima do cotidiano para ser reverenciada. Pretendem, portanto, extrapolar as funções e valores tradicionais do museu para pautar não apenas a fruição da arte, mas a sua apropriação na relação concreta com a cultura contemporânea.

O enfrentamento do contexto brasileiro leva à percepção das dificuldades, dos conflitos a serem travados, das concessões a serem feitas e das realizações frustradas, no entanto, aprofunda também uma consciência da realidade social brasileira, enxergando na conexão com a cultura popular um potencial transformador, sem condescendência paternalista, mas profundamente embasado pelos valores humanos expressos na forma de arte.

Na busca por um elo de ligação entre a modernidade e a autenticidade primitiva das manifestações populares, Lina encontrará no nordeste uma fonte de riquezas culturais, um novo Brasil dentro do próprio Brasil. Descobre na "civilização do nordeste" a manifestação de princípios essencialmente modernos, para imaginar, a partir do pré-artesanato encontrado, a possibilidade concreta de transpor a fissura entre máquina e trabalhador, propondo um centro de cultura onde se tentaria convergir a expressão artística e as técnicas modernas, congregando artesãos e estudantes da universidade, prática e teoria.

No entanto, como processo, esta proposta dependia da formação de certas condições sócio econômicas, e por certo período de tempo o contexto pareceu favorável: no solar do Unhão Lina chegou perto de montar uma oficina de desenho industrial brasileiro em articulação com outras instituições, como a Universidade da Bahia e a SUDENE. Até então os caminhos ainda não estavam determinados e poderiam pender para a valorização do homem, de suas vocações e sua autonomia. Porém, em 1964 as perspectivas se interrompem e os canais de comunicação com as manifestações populares bloqueados com uso de canhões; restando a revolta, a "liberdade de dizer não", e uma proposta de revisão crítica da cultura.

O Masp, na Sete de abril e na Av. Paulista, o Mam e o Map em Salvador, são desenvolvidos num momento de transição e impasse, quando parecia viável impulsionar no Brasil um processo humano e democrático de modernização da sociedade, aliando valores artísticos e manifestação popular às técnicas da indústria. Diante do "bívio" entre popular e finesse ainda se poderia escolher o caminho de coerência entre maquinização e a riqueza da cultura brasileira, convergindo local e universal, popular e erudito, numa unidade pautada por uma concepção ampla da arte.

As arquiteturas que Lina Bo Bardi propõe no período representam o enfrentamento da realidade social brasileira a partir de um projeto amplo de formação cultural, constituindo não apenas salões de fruição estética, mas centros vivos, difusores de novas formas de cultura e arte. Mas, como dirá Lina posteriormente, "a Arte não consola nem tira ninguém da fome, sede e privação"; e a opção do país por um processo de industrialização alienante que aprofunda a dependência e agrava a miséria, opção pela "finesse", interromperá estes projetos e demandará novas propostas, levará a novas arquiteturas.

Este Trabalho Final de Graduação se propôs a analisar a arquitetura a partir de sua inserção neste cruzamento complexo de relações entre um projeto amplo de transformação da cultura e o contexto de modernização do país no período do segundo pós-guerra. Procurou-se identifcar os conteúdos principais e acontecimentos determinantes ligados à proposta do Masp e a sua constituição arquitetônica não apenas como edifício, mas princpalmente como espaço e lugar referencial na cidade.

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