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secao 4!

Córregos Ocultos:

redescobrindo a cidade

Maria João Cavalcanti Ribeiro de Figueiredo

Vladimir Bartalini

Resultado de séculos de urbanização predominantemente voltada para fins econômicos, a rede hídrica paulistana está praticamente ausente na paisagem. Do centro expandido da metrópole, conhecemos os rios Tietê, Pinheiros e Tamanduateí, ainda visíveis, porém estrangulados pela rede viária. Alguns córregos de maior porte ainda permanecem inteligíveis à população pois, embora muitas vezes canalizados, podem ser facilmente associados às avenidas de fundo de vale. São os casos das Avenidas Sumaré, Pacaembu, Nove de Julho e Vinte e Três de Maio, entre outras.

Já a rede hídrica capilar é praticamente anônima e quase imperceptível na paisagem urbana. “No entanto essas águas, embora ocultas, ainda ‘vivem’, e os indícios de sua existência podem estar num bueiro, por onde se as ouve e sente, ou em eventuais insurgências (...). Em outros casos, o córrego clandestino é denunciado por um beco ou uma viela, quase sempre desertos, abandonados, encerrados pelas paredes de fundo das construções. Outras vezes, os vestígios são nesgas de terra, pequenas sobras de desapropriações para a tubulação do córrego, onde a vegetação cresce espontaneamente. Em situações mais felizes os indícios podem estar numa área verde pública, em geral pequena e amorfa, a que se dá abusivamente o nome de praça, ou ainda em escadarias que, embora não coincidam com as margens ou com o leito dos cursos d’água, evidenciam as condições de um relevo acidentado, características das áreas onde se concentram as nascentes dos córregos, fazendo alusão a eles” (i).

Este Trabalho Final de Graduação nasceu do desejo de se pensar a cidade, entendida como o espaço de consolidação da sociedade (ii). De um histórico pessoal de trabalhos sobre ela, de sua observação e da compreensão da necessidade de uma completa transformação na relação que se estabelece hoje entre seus habitantes e entre seus habitantes e seu suporte físico.

Sendo um elemento imprescindível à boa qualidade de qualquer ambiente, além de ser fundamental à nossa sobrevivência, a água é um inexaurível manancial de recursos de projeto.

Os rios urbanos representam enormes potenciais urbanísticos e humanos. Abrem horizontes importantes na apreensão visual da cidade e determinam sistemas de circulação de baixa declividade, ideais para a implantação de parques lineares e ciclovias.

Os córregos ocultados pela malha urbana também desenham os caminhos de menor declividade pela cidade e, assim, representam espaços ideais para a implantação de parques lineares ou de uma rede conectada de parques ou praças ao longo de seu percurso. Além disso, os córregos ainda ocultos da cidade da São Paulo possuem potencialidades pedagógicas, na medida em que receberem intervenções que visem recontar sua história (e, assim, também a da cidade) e explicitar os elementos básicos do suporte físico do meio urbano.

Enquanto ações estruturais como as descritas acima não ocorrem, pode-se propor a redescoberta de córregos ocultos como uma campanha de redescoberta de bairros, de redescoberta da cidade. Cada cidadão pode sair de sua casa passeando pelo seu bairro (ou simplesmente optar por sair a pé ao se deslocar por curtas distâncias), atento a vestígios, a indícios da existência de corpos d’água no subsolo. Com todos seus sentidos voltados para a cidade, seus espaços, seu suporte físico e seus habitantes. A sensibilização do olhar da população pode estimular a reflexão e a crítica sobre os projetos de cidade e para a cidade, pode ajudar a formar cidadãos mais conscientes do espaço onde vivem e da possibilidade de se criar uma cidade mais humana, democrática e coletiva.

Esse trabalho versará, então sobre os rios urbanos da cidade de São Paulo, mais especificamente, a rede hídrica capilar central da metrópole, quase completamente encoberta pela malha urbana. Os objetivos dessa pesquisa são basicamente dois: localizar córregos ocultos na mancha urbana consolidada do centro de São Paulo através da procura desses vestígios na paisagem, como uma experiência de sensibilização e conscientização do olhar do arquiteto, e fazer uma proposição que busque explicitar aos habitantes dessa cidade a existência desses corpos d’água.

Para a localização de córregos ocultos foram realizadas concomitantemente caminhadas, análises de bases topográficas e leituras de referências históricas: levantamentos de campo, cartográfico e bibliográfico.

O córrego “encontrado” e foco desse trabalho se chama Anhanguera a as imagens de 1 a 4 mostram resumidamente a pesquisa realizada sobre ele.

A constatação da precariedade do sistema de canalização do Córrego Anhanguera abriu uma inesperada vertente de pesquisa, pautada pela busca de soluções técnicas para o escoamento das águas fluviais e pluviais.

Nesse trabalho foi proposto um novo canal de escoamento das águas desse córrego (5), com grande parte de seu percurso em concordância com as ruas e avenidas. Possui aproximadamente 4km de extensão, sendo que a cada curva haverá uma bacia - de detenção ou retenção e/ou sedimentação - in line, facilitando hidraulicamente as mudanças de direção do fluxo de água. No total serão onze reservatórios, que somados à décima-segunda intervenção proposta (na nascente), comporão as doze intervenções nesta rede, formando doze praças, espaços de lazer, de encontro e de contemplação da água.

Para o canal foram pensados três tipos de seção, de acordo com a rua por que passam (6 e 7).

As 12 intervenções não puderam ser detalhadas. No trabalho, foram apresentados projetos de referência para cada uma delas. Apenas a 12ª, na nascente do córrego, foi aprofundada (8 a 10).

i. BARTALINI, 2006. Página 90.
ii. Segundo definição de Jonas Malaco, “A cidade é um modo de existência da sociedade. (...) A sociedade, é a nossa existência conjunta enquanto espécie, (...) apresenta-se como existente somente enquanto os indivíduos estão imediatamente e sensivelmente se relacionando, deixando de existir quando não o fazem”. MALACO, 2003, pg.

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