A presente proposta, qualificada como trabalho final de graduação, é um exercício de projeto de arquitetura, considerando-se condicionantes espaciais, culturais e construtivos. É interessante, dentro do contexto deste estudo, que se busque uma abordagem mais ampla e complexa para a atividade projetual. A qualidade de uma edificação não deve ser pura e simplesmente a resolução de disposições construtivas e programáticas, mas também deve ser a expressão de um anseio, de uma proposta de confronto às contradições com as quais nos acostumamos dentro do meio em que vivemos.
Foi o julgamento natural de que o projeto a ser realizado deveria ser localizado na cidade de São Paulo, por ser uma cidade que grandes subsídios oferece, em termos de vivência, para o amadurecimento do olhar do arquiteto. A cidade apresenta tantas contradições e peculiaridades, no que se refere ao uso do espaço e na qualificação de uma cultura construtiva, que surge como imprescindível uma vontade de apropriação da arquitetura para a atenuação dessas dissonâncias. O desejo de uma cidade em que os seus agentes possam todos dispor de habitações que sejam adequadas, acesso a infraestrutura pública de transportes, órgãos institucionais, lazer, cultura, e salubridade, parece a primeira vista amplo e utópico, e surge também como desafio para o arquiteto a necessidade de filtrar esses questionamentos e traduzi-los em propostas de intervenção que sejam exeqüíveis e responsáveis.
Considerando-se todas essas questões, acabou-se por conformar uma proposta de ocupação multifuncional do local escolhido, como forma de contemplar diferentes atividades e espectros sociais. O principal aspecto do discurso, que caracteriza o fio condutor deste trabalho, é permitir que a cidade seja vivenciada de forma franca e intensa pelos seus agentes. As características e peculiaridades do terreno escolhido, como vemos no decorrer do trabalho, também fizeram surgir outra premissa de projeto, que é a conformação de um espaço livre no interior do lote. De forma que fosse capaz de assumir uma função de conectividade na cidade, interligando diferentes usos, diferentes cotas, diferentes ruas
Houve uma busca pelo centro de São Paulo, e facilmente se chegou ao reconhecimento do edifício de 1943 localizado nos números 570/594 da Avenida Nove de Julho, antiga sede do IAPETC, que posteriormente haveria de se tornar a sede paulista do INSS. A primeira proposta, de reabilitação deste edifício ligada ao estabelecimento dos usos mistos cedeu lugar à outra proposta mais ampla. Partiu-se para reconfiguração deste e de outros 4 lotes adjacentes, conformando um complexo de 5652m², que traz como pressuposto a manutenção de alguns elementos existentes, como o próprio edifício antigo do INSS, ou um muro de arrimo de alvenaria, responsável por vencer 10 dos 18 metros de desnível existente no terreno.
Um dos elementos mais importantes desse projeto é o espaço que surge no miolo desse lote, fruto do desejo de conexão entre a Rua Álvaro de Carvalho e a Avenida Nove de Julho. Essa conexão foi considerada necessária como elemento de costura na cidade, permitindo a existência de um fluxo por entre o quarteirão, que hoje em dia é realizado alternativamente utilizando-se as escadarias dos viadutos contíguos. Considerando esses elementos, e a flagrante subutilização do solo no restante do perímetro escolhido, partiu-se para o projeto:
Em primeiro lugar, houve o interesse de dotar um uso habitacional à proposta. Foram propostas cinco tipologias habitacionais, com tamanhos e características diversas. Por fim, houve a produção de 106 unidades habitacionais no local.
Outro elemento do programa é uma nova sede para o Conservatório Dramático e Musical do município, instituição de ensino superior que caracterizou-se como uma das mais respeitadas de ensino musical, na cidade. Comportando 150 alunos, o novo conservatório é adequado aos parâmetros ditados pelo MEC.
No programa também figura o projeto de uma creche municipal, com a intenção de suprir uma carência por esse tipo de instituição educativa dirigida para a específica faixa etária de crianças entre 0 e 5 anos, e dessa forma acaba por atender 200 crianças.
Busca-se aproveitar o térreo para o estabelecimento de pequenos estabelecimentos comerciais, nos dois lados do terreno.
De forma geral, as intervenções propostas geram dois novos edifícios predominantemente habitacionais, e a requalificação do edifício existente que sofre uma readequação e uma expansão com a construção de volume anexo. Articulando esses volumes, a área livre no interior do lote, que atua ao mesmo tempo como eixo de conexão e espaço público de lazer.
O sistema construtivo baseia-se na utilização de uma estrutura reticulada de concreto armado para os novos prédios habitacionais. É proposta uma coordenação modular, que ao mesmo tempo serve para a estrutura, e para os subsistemas de esquadrias e vedações. Para as habitações, é utilizado um sistema leve de gesso acartonado. Para o volume que se caracteriza como extensão do edifício existente, procurou-se a utilização de vãos maiores, que ao mesmo tempo permitem a liberação do solo para livre fruição do espaço e também o melhor aproveitamento do espaço dedicado ao auditório. Dessa forma, o sistema estrutural é dependente de lajes nervuradas nos dois sentidos, para proporcionar maior rigidez ao corpo do edifício. Utiliza-se como estrutura de apoio a própria prumada de infraestrutura, locada adjacente à empena vizinha.
Uma das diretrizes deste projeto foi a preocupação construtiva, com a determinação dos métodos, recursos e materiais que podem ser utilizados. Considerando que existem por toda a cidade, e especialmente no centro, diversos outros edifícios em semelhante situação de precariedade dos subsistemas, falta de condições de habitabilidade, e deficiência no diálogo com seu entorno, é interessante que a proposta seja útil para delinear um modelo de reforma e readequação que possa ser replicável nesses frequentes casos.
