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secao 4!

Revelação do Córrego Verde em Pinheiros

Mariana Yamamoto Martins

Vladimir Bartalini

O tema geral deste trabalho são os “córregos ocultos” na cidade de São Paulo, ou seja, os cursos d’água secundários, ou capilares, que foram tamponados, cujos vestígios na paisagem urbana só podem ser percebidos indiretamente. São cursos d’água que correm sob ruas, vielas, recuos de prédios, praças, clubes. A população em geral, e mesmo os moradores das redondezas, não têm conhecimento da sua existência. O trabalho foca, portanto, as relações que se estabeleceram entre paisagem natural e ocupação urbana, e as conseqüências desta relação expressas no desenho da cidade atual.

Os espaços percorridos pelos córregos se tornaram vias, vielas e lotes, sob os quais agora eles passam canalizados e “invisíveis”. Suas expressões na paisagem urbana atual são encontradas nas ruas tortuosas, sem saída ou particulares, nos bueiros de dimensões maiores que as usuais, nas grelhas de águas pluviais através das quais podem ser vistos, nas vielas e travessas, nos recuos de lotes já construídos, nas praças e etc.

Os objetivos deste trabalho são:

I. Apontar maneiras de mostrar aos moradores e usuários do entorno de um córrego que os rios existem e fazem parte da cidade, mesmo que não sejam visíveis.
II. Resgatar o traçado do córrego, da nascente à foz, e propor maneiras de fazê-lo visível, mesmo que de forma simbólica.
III. Propor um espaço onde seria possível a revelação do córrego, a fim de provocar uma reflexão sobre o ocultamento dos cursos d’água na cidade.

Dentre os mais de 300 córregos canalizados da cidade de São Paulo (Fonte: Programa Córrego Limpo, SABESP, 2009), selecionou-se, para este trabalho, o trecho de um córrego situado no bairro de Pinheiros, entre as avenidas Doutor Arnaldo e Henrique Schaumann, pertencente à bacia do Córrego Verde, por sua vez inserido na Bacia do rio Pinheiros. O córrego Verde se divide em dois braços, segundo a Prefeitura de São Paulo. O presente trabalho é focado no braço 2, com aproximadamente 4 km de extensão, que começa entre as ruas Oscar Freire e Capote Valente, e finaliza cruzando o Clube Hebraica, na rua Dr. Alberto Cardoso de Melo Neto, antes de desaguar no Rio Pinheiros.

Foram realizadas cinco visitas a campo, a fim de se descobrir o traçado atual do córrego. O percurso inteiro foi realizado, da nascente à foz, procurando detalhes que revelassem a sua presença. Na maioria dos casos, o antigo trajeto se transformou em traçado viário, algumas vezes seguindo exatamente o seu percurso. Nos demais casos, observaram-se, por exemplo, terrenos vazios, estacionamentos, vielas, casas com grandes quintais, um clube, pequenas praças, etc.

O objetivo da proposta de intervenção é permitir que o córrego Verde apareça de alguma forma no desenho arquitetônico, de modo que ele seja percebido pelos freqüentadores do espaço. Através do edifício, este espaço recebe uma função concreta, um uso constante. Isso não ocorre quando se projeta uma praça ao ar livre, por exemplo, pois não é possível se prever o retorno que a população dará ao projeto depois de pronto. Portanto, ao permitir o uso do espaço ao mercado imobiliário o projeto pode se fortalecer e se manter, tanto no sentido financeiro, que envolve investimento, reformas, manutenção; como no sentido de atração de pessoas.

Foi criado o córrego de pedras, que assim como o córrego Verde, atravessa o terreno, desce o relevo e segue para a Rua Paulo Gontijo de Carvalho. No primeiro plano, na cota 759 metros, o córrego consiste em um canal central, de aproximadamente 40 cm de profundidade e 2% de inclinação, de concreto, coberto por pedras. Quatro canais menores representam seus afluentes, com aproximadamente 20 cm de profundidade e a mesma inclinação. Por sua vez, estes recebem a água da chuva que cai da cobertura deste trecho do edifício e é coletada pelas canaletas laterais, localizadas nos recuos. Assim, a chuva atua como nascente do córrego de pedras, e a ideia é que em dias chuvosos este curso d’água “esteja em funcionamento”, levando a água captada da cobertura aos canais afluentes, em seguida ao canal central, se tornando uma cascata de pedras quando o terreno desce e finalmente desaguando no bueiro ao fim da escadaria, onde se daria o encontro com o córrego Verde canalizado.

Esta proposta possibilita sensações diferentes conforme a presença ou não da chuva. Em tempo seco, o córrego de pedras representa o enterramento do córrego, pois no lugar onde deveria estar a água, estão as pedras. Em tempo chuvoso, o córrego ganha vida, fazendo um sistema de circulação da água – nascente – afluentes – deságue – completo.

Acompanhando a descida do terreno (sete metros de desnível), o córrego se transforma em cascata, através de “pedras” de concreto intercaladas em diferentes alturas e formatos posicionadas dos dois lados do canal. Essas pedras também tem a função de estar, pois suas dimensões permitem seu uso como bancos. Após a descida da escadaria, encontra-se o acesso à Rua Paulo Gontijo de Carvalho. O córrego de pedras “deságua” no poço de captação, que se liga à galeria existente do Córrego Verde. O programa deste edifício é livre. Uma livraria, um café, uma loja de roupas, uma academia. As plantas permitem a flexibilidade na utilização dos espaços.

Ao propor um espaço sobre um córrego já canalizado, criando maneiras de representá-lo simbolicamente, relacionando as características topográficas do espaço e as formas de ocupação dos lotes à presença deste curso d’água, este trabalho espera estimular pensamentos que evoluam ao desenvolvimento de projetos de recuperação / revitalização urbana ou simplesmente pensamentos que tragam a memória de um lugar escondido ao longo do tempo. Com a rica estrutura hídrica da cidade de São Paulo e do país, de maneira mais ampla, pode-se dizer que é possível se criar muitos projetos para estes espaços, de maneira diferente desta que canaliza, enterra e oculta.

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