O trabalho discute o pátio ferroviário da Luz como um dos elementos de desarticulação de uma área central consolidada, com abundância de equipamentos e infra-estrutura. A análise e a proposta abordam a questão da inserção urbana da ferrovia, do acesso do pedestre ao transporte público e da integração entre os modais existentes na região. A estratégia escolhida foi a de transformar o Pátio da Luz, grande quadra intransponível, em uma quadra permeável, fazendo uma costura do tecido urbano, que já nasceu interrompido pelos trilhos nesta área.
A proposta para o Pátio de insere na diretriz de inserção urbana da ferrovia no trecho Barra Funda - Luz, considerando seu enterramento e a implantação de um parque linear na atual faixa ferroviária.
Propõe-se a reorganização de fluxos de pedestres e usuários do transporte público na fronteira entre Bom Retiro e Luz a partir da necessidade de expansão da Estação da Luz (CPTM). A implantação de novas plataformas com novos acessos à Estação da Luz torna a quadra um espaço público permeável e estabelece continuidade do tecido urbano.
O objetivo é atenuar a barreira imposta pela ferrovia, favorecer a intermodalidade das viagens e facilitar o acesso da estação aos equipamentos e ruas de comércio especializado. Para isso, serão consideradas as diretrizes da CPTM para expansão da Estação da Luz e a integração dos ônibus municipais e intermunicipais a ela.
Para que o nó da Luz cumpra sua função de mobilidade tanto na escala metropolitana quanto na escala local, a proposta se organiza em três eixos:
1. intervenções nas linhas da CPTM: nova configuração espacial das linhas em operação e incorporação da plataforma para o Expresso Aeroporto.
2. uso dos espaços liberados com o enterramento da ferrovia: requalificação de espaços livres públicos e dos deslocamentos a pé nas imediações da Estação da Luz, bem como melhoria no acesso a ela.
3. incorporação dos ônibus municipais e intermunicipais à estação intermodal: substituir o Terminal Princesa Isabel por uma Estação de Transferência junto ao novo setor da Estação da Luz.
As linhas que usam o Terminal Princesa Isabel e as linhas da EMTU terão parada junto à Al. Cleveland e à Rua Helvétia. Assim, o usuário do ônibus fica próximo ao setor oeste da Estação da Luz, atrás da gare da Julio Prestes.
Para a faixa por onde hoje passam os trilhos que vêm da Barra Funda, propõe-se um passeio para pedestres e ciclistas, pontuado por marcos referenciais já existentes. Essa ciclovia terá conexões com outras, parte de um possível sistema local. Tal proposta se insere numa perspectiva de adensamento e requalificação dos bairros à margem da ferrovia, incentivados pelo zoneamento (ZCP e ZEIS) e pelas Operações Urbanas. A implantação de um espaço público de lazer que sirva também para pequenos deslocamentos a pé ou de bicicleta pode contribuir para as transformações das áreas adjacentes à ferrovia, previstas pelo Plano Diretor.
Com a desativação do pátio ferroviário e implantação de parte das plataformas da estação da Luz, é possível atravessar a quadra e estabelecer a continuidade do tecido urbano entre Bom Retiro e Campos Elíseos. A rua Ribeiro de Lima, que hoje acaba no muro do pátio, pode continuar rumo à rua Helvétia, que começa em frente à Estação Julio Prestes. A transposição é destinada apenas a pedestres e, conforme vence o desnível de sete metros, permite acesso ao setor Oeste da Estação da Luz, ao Parque Linear Luz-Barra Funda e seus equipamentos de apoio (bicicletário, sanitários públicos, salas de manutenção, serviço de informações e guarda-volumes).
Propõe-se que os trens da linha 8 cheguem à Luz, e não mais à Julio Prestes, criando uma nova integração física e tarifária para esta linha.
Assim, a Estação da Luz, que já se encontra sobrecarregada, seria ainda mais utilizada, gerando a necessidade de uma ampliação: o setor oeste, com plataformas para as linhas que partem nesse sentido (linhas 7 e 8) e também para o Expresso Aeroporto (linha 14).
A implantação da Luz Oeste foi determinada pela distância em relação às plataformas existentes e o acesso a elas, pelo traçado possível para os trilhos em vala a céu aberto e pela possibilidade de construção em etapas, sem prejudicar a operação das linhas 7 e 8 durante as obras.
Foram considerados aspectos gerais da construção da Estação da Luz Oeste subterrânea. A opção por vala a céu aberto parece vantajosa, já que os edifícios do pátio serão demolidos e o terreno poderá ser escavado.
Pensando na viabilidade da proposta, considerou-se a continuidade da operação dos trens durante o período de construção. Como a nova estação será implantada aproximadamente onde hoje há o grande galpão do pátio ferroviário, a chegada à gare existente não ficará obstruída com as obras. Será necessário que as linhas 7 e 8 apenas compartilhem trilhos durante o enterramento da linha. Com a nova estação completa e os trilhos rebaixados, os trens podem deixar de utilizar a Luz Leste e a Julio Prestes e a segunda etapa de obras pode ser começada.
Esta proposta de intervenção exigiu compreender a complexidade das dinâmicas existentes no local e eleger focos de discussão que cabem ao arquiteto e urbanista, embora seja clara a importância do trabalho multidisciplinar.
A proposta exigiu que fossem consideradas ao mesmo tempo a escala do edifício e o planejamento da infra-estrutura. A escala do edifício aparece na medida em que as limitantes espaciais e construtivas interferem na viabilidade da proposta para os fluxos de pedestres e espaços que articulam esses percursos. Da mesma forma, a reformulação das integrações entre os modais teve que considerar sua inserção na rede metropolitana.
Além das questões de ordem funcional, a proposta busca dar qualidade aos percursos criados, pontuando-os com programas complementares e melhorando o acesso aos equipamentos já existentes, cujo potencial é hoje subaproveitado.