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secao 4!

Situação de rua e o Projeto Nova Luz:

Rede de equipamentos para proteção social

Pedro Ichimaru Bedendo

Maria Luiza Corrêa

INTRODUÇÃO

A decisão pelo tema deste TFG não surge de um interesse primeiro e específico pela questão da população de rua, mas da vontade de discutir os processos de transformação do centro da cidade de São Paulo, a partir de alguma proposta concreta de intervenção projetual.

O recorte físico que tomo como ponto de partida é o perímetro do Projeto Nova Luz organizado pela prefeitura da cidade através da EMURB em 2004. A escolha foi baseada fundamentalmente na convergência de questões sociais, históricas, econômicas e urbanas, que são partes de um debate já bastante antigo.

Se o pontapé inicial não foi dado com direção precisa, a reflexão e a aproximação com as problemáticas da região foram me conduzindo, cada vez mais, ao estudo da complexidade dos circuitos de vida em situação de rua, que emergem com extrema potência na análise da paisagem urbana. Por essa complexidade e pelo ineditismo dentro do meu campo de estudo acadêmico, a construção de argumentos e de uma linha de pensamento mais ou menos clara sobre o assunto demandaram, e ainda demandam, bastante esforço.

O trabalho está montado a partir de duas frentes principais: as implicações dos projetos de revitalização do centro de São Paulo e os aspectos relacionados às populações de rua e o consumo prejudicial de drogas. Esses dois temas permeiam tanto as revisões teóricas quanto às justificativas para as ações propositivas.

PROJETO NOVA LUZ E POLÍTICAS DE REVITALIZAÇÃO

O Projeto Nova Luz faz parte de um modo específico de pensamento da política pública, ansioso por grandes transformações no centro da cidade de São Paulo, que legitimam sua iminente necessidade através de quadros de 'degradação' social, mas que os desconsidera em suas ações propositivas.

Podemos observar que o estado de ‘degradação’ da região está formado por dois componentes principais: a existência de muitos edifícios desocupados, ao menos oficialmente, já que vários deles são utilizados como moradia por movimentos sem-teto; e a grande concentração de populações vulneráveis.

A componente que trata das populações vulneráveis, tem nos moradores de rua sua maior expressão na paisagem urbana, e isso nem sempre recebe a devida atenção. Apesar de, em números absolutos, ser um grupo bem menor que outras populações também vulneráveis, como moradores de cortiços e favelas, a população em situação de rua representa o nível mais agudo de exclusão social. Pela importância de seu enfrentamento, na dinâmica de qualificação do espaço público no centro de São Paulo, faço deste trabalho uma tentativa de aporte à discussão de suas possibilidades.

ASPECTOS DA POPULAÇÃO EM SITUAÇÃO DE RUA

De maneira geral, são pessoas que, por uma série de fatores, vão sendo colocadas à margem dos sistemas produtivos e fragilizadas pela condição de extrema pobreza, perdendo gradativamente vínculos e valores comuns à nossa sociedade. A rua, como espaço de todos e de ninguém, é a alternativa que lhes resta para buscar meios de sobrevivência.

A inexistência de alternativas dentro da exclusão da rua coloca a experiência das drogas como um elemento capaz de reunir pessoas e promover seus relacionamentos. Ainda que distorcidos frente à nossa cultural formal, conseguem, de alguma maneira, configurar um meio de representação social.

Além disso, o estado alterado de consciência propiciado pelo consumo das drogas auxilia o enfrentamento tanto de perturbações psíquicas e emocionais quanto das provações físicas que a situação de rua impõe.

O consumo das substâncias psicoativas é condicionado ao contexto do processo de exclusão social, e, numa visão sistêmica, não é, necessariamente, o problema principal. É sim, parte importante e delicada de um problema maior e mais complexo, e a condução de seu acompanhamento deve considerar essa ponderação.

Ainda que se possa verificar a existência de uma variedade de serviços públicos em funcionamento, percebemos que apresentam dois problemas principais: a insuficiência de sua capacidade nas áreas de maior demanda e a desarticulação funcional entre os equipamentos. No intento de aprofundar a discussão da resolução dessas deficiências, se desenvolvem as ações propositivas.

PROPOSTA DE UMA REDE DE EQUIPAMENTOS PARA PROTEÇÃO SOCIAL

Primeiro, faço um exercício de análise programática. Buscando enxergar as demandas fundamentais atendidas pelos equipamentos públicos existentes, organizo três grandes grupos de tipos de uso, a partir de uma adequação das atividades ao equilíbrio biológico natural do ser humano. São eles: Abrigo (noite-a-noite), Ocupação (dia-a-dia) e Suporte à saúde (caso-a-caso).

Então, faço um plano ‘explodido’ de distribuição dos programas pela cidade, uma proposta de microintervenções pulverizadas, em contraposição a uma macrointervenção centralizada. A análise dos enfrentamentos às problemáticas da situação de rua feita anteriormente já supunha a necessidade de diversidade de programas e equipamentos. A visão urbana da cidade como objeto complexo, vem para reforçar a ideia de espalhamento espacial dos pontos de intervenção, na medida em que isso não sugere transformações radicais na constituição física e morfólogica das cidades.

PROPOSTA DE PROJETO DE UM ALBERGUE

Como exercício final deste trabalho, seleciono um dos equipamentos do plano elaborado no capítulo anterior para desenvolver o projeto arquitetônico: o albergue na Rua General Couto de Magalhães.

Aqui me debruço sobre um caso específico para poder trabalhar a escala do projeto do edifício como uma manifestação concreta das aproximações teóricas apresentadas nos primeiros capítulos. O exercício do projeto satisfaz a necessidade material que tem a arquitetura, como ciência social aplicada. Isso não significa que o projeto desenhado seja esteticamente pretensioso, ao contrário; as soluções apresentadas se fundamentaram numa clareza compositiva e na profunda consideração do ‘lugar’ de inserção do projeto.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A situação de rua no centro de São Paulo, assim como nos centros de outras grandes cidades do mundo, é mais um desdobramento da pobreza gerada pelo modelo capitalista de organização do nosso Estado.

Nas últimas décadas, o crescimento descontrolado das periferias da cidade ganhou proporções tão assustadoras que, em certa medida, foi capaz de mobilizar a opinião pública. A sociedade, hoje, já assume sua parcela de responsabilidade pela miséria desses locais e vê com bons olhos os investimentos públicos para intervenções em favelas e áreas de risco. Projetos de habitação de interesse social são de grande importância nas discussões políticas e acadêmico-arquitetônicas.

Entretanto, este comprometimento social parece não ser estendido à situação de rua. A maior parte das ações públicas de enfrentamento a essa questão são extremamente tímidas e limitadas, e o sistema de proteção social em São Paulo ainda é profundamente dependente da disposição de pequenas organizações particulares e não-governamentais.

De maneira geral, o foco deste TFG foi se aproximar da discussão sobre as implicações políticas, econômicas e sociais do Projeto Nova Luz, e a partir do entendimento de suas deficiências de formulação, exercitar a limitada contribuição que um arquiteto pode dar ao enfrentamento de problemas conjunturais, como são as populações em situação de rua e o seu cruzamento com o consumo prejudicial de álcool e outras drogas.

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