logofau
logocatfg
secao 4!

Ensaio projetual na várzea central:

sobre a construção de programas e arranjos espaciais

Thiago Adonis Parucci dos Santos

Alexandre Delijaicov

Este trabalho se debruça sobre uma São Paulo imaginária, cidade que não existe. Propõe-se, então, como um meta-projeto. Um exercício em diversas escalas que incorpora a premissa da cidade das várzeas; uma São Paulo fluvial, prevista a partir das idéias de Saturnino de Brito e desenhada em sua dimensão metropolitana por Alexandre Delijaicov. É o reconhecimento da crise sistêmica da metrópole, construída através da incorporação técnica do território de suas várzeas que provoca esta decisão pela consideração de uma cidade modificada, em movimento, e não a cidade existente, considerando assim que uma mudança desejada das funções e arranjos urbanos é possível à partir de uma alteração das relações estruturais da cidade.

Esta São Paulo possível, fluvial, fornece uma visão notável, adotada como sítio de projeto: o lago-porto central da cidade à beira da colina histórica, construído sobre a várzea do Carmo, atual Parque D. Pedro II. Este território de várzeas redimensionado, reincorporado pelas águas fornece, assim, as pré-condições para se imaginar uma reorganização das inter-relações urbanas estruturadas à partir das várzeas: uma reconstrução, então, de conteúdos e sentidos históricos do lugar à partir deste lago.

Eleitas as premissas – o lago porto central – e o partido de projeto – as três ações “edificadas”, realiza-se assim a conformação de um arcabouço teórico arquitetônico capaz de sustentar a discussão final do trabalho: sobre a construção de programas e arranjos espaciais.

Como ferramentas de projeto, três ações primordiais retiradas da tese de doutorado de Angelo Bucci: mirar, invadir e transpor. Eleitas por conterem uma leitura oportuna das morfologias - física e histórica – do sítio, estas ações, carregadas de um imaginário arquitetônico urbano paulistano, fornecem uma lógica capaz de conduzir, enfim, a dimensão material das relações urbanas explodidas pela cidade fluvial, permitindo imaginar os meios construtivos para realizá-las: mirar, invadir e transpor; o lago (canal), a ponte e a torre.

Estas três tipologias construtivas eleitas e imaginadas como sustentáculos físicos de uma retomada de dimensões e sentidos deste recinto central arranjam-se no espaço de modo a retomarem as lógicas espaciais engendradas historicamente pelos espaços públicos locais. Locais historicamente tão significativos ao imaginário da cidade como a praça da Sé e o Largo da Concórdia articulam-se, segundo esta visão de projeto, através de seqüências espaciais que retomam a importância de edifícios e percursos históricos. Assim, como que lançando-se à partir dos eixos, edifícios e praças constituídas no local, a implantação do projeto catalisa a reconstituição de conteúdos urbanos. Desenha-se, assim, uma infra-estrutura urbana pensada na nova escala do local que mostra-se como suporte de programas e usos urbanos possíveis, carregando em seus percursos uma dimensão de urbanidade que hoje é negada pelo super-adensamento deste território.

À partir da cota 736 junto à colina central, alinhada ao eixo da Ladeira do Carmo – atual Avenida Rangel Pestana, as ações propostas constituem-se numa sequencia lógica encadeada por este grande gesto – o eixo histórico de entrada Leste da cidade retomado. Esta cota que ampara a invasão aérea da várzea, a 10 metros do térreo baixo da cidade na beira do lago central, desdobra-se em um nível intermediário, multiplicando a cota de invasão - o tabuleiro da ponte – e permitindo assim a ocupação deste eixo de interface das duas margens do lago: uma ponte feira popular pública.

Amparando as transposições entre estes térreos, naturais e criados, três torres em concreto e aço junto das cabeceiras da ponte alinhadas ao edifício Guarani, de Rino Levi, anunciam o lago central e a entrada ao centro. Estas prumadas verticais de circulação articuladas por rampas circulares e praças públicas cobertas oferecem-se a cidade como acolhimentos articuladores de funções urbanas. Vão, através de uma sucessão de níveis, multiplicando os térreos da cidade para além das transposições, fornecendo assim as bases para o surgimento de programas públicos que amparam e são amparados por esta ação – transpor. Quadras esportivas, biblioteca e teatro; como um SESC diluído pela cidade em três edifícios, equipamentos públicos que modulam estas transposições, preenchendo-as de significado urbano.

O conjunto torre-ponte sustenta-se neste lago central, espaço técnico da cidade redimensionado em seus aspectos espaciais e funcionais. É, verdadeiramente, um vazio que dá sentido ao construído da cidade; um vazio que preenche. Uma assinatura de água no território que ampara, para além das questões infra-estruturais da metrópole, relações e significados urbanos locais. É esta abertura na paisagem construída que pressupõem a primeira e a última das ações: mirar. Para além desta ação, o lago e as águas urbanas constituem-se como um intermediador de relações possíveis entre os espaços públicos do local; uma possibilidade de se pensar os equipamentos públicos como uma rede articulada pelos canais e lagos urbanos. Para além disso, pensa-se no caráter arquitetônico destas águas que banhando o entorno dos edifícios de equipamentos atribuem assim a eles uma idéia simbólica de conjunto; uma riqueza espacial quando pensamos na quantidade e variedade deste tipo de edifícios implantados nos arredores do Parque D. Pedro II.

Três tipologias ou escalas construtivas para três ações de projeto, arranjadas à partir da leitura da trama histórica da cidade. Uma reconstituição do local que constrói uma verdadeira topografia de infra-estruturas, arranjadas em eixos espaciais repletos de funções e sentidos urbanos.

slideshow image

If you can see this, then your browser cannot display the slideshow text.

 

topo