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secao 4!

O patrimônio urbano e o desenvolvimento da cidade

Agnes Helena Chiuratto

Maria Lucia Bressan Pinheiro

Quem já andou por Pompéia, a desafortunada cidade soterrada pelas cinzas do Vesúvio, certamente encontrou mais prazer em conhecer um bar ou uma padaria da antiguidade do que em contemplar mais um monumento à glória de Augusto.

E quem poderia não se angustiar por aquelas pessoas comuns de outrora, preservadas eternamente nas formas mortais da erupção, que chegaram a nossos olhos? Ao vê-los pensamos em nós mesmos, e embora não haja quem possa explicar a verdade última desses fatos, também não se pode negar que esse reconhecimento tem qualquer coisa de importante para a nossa identidade.

Uma cultura, enquanto entidade abstrata pode ser descrita em livros, organizada minuciosamente em capítulos e parágrafos. Mas enquanto entidade concreta ela depende das pessoas que a criam e que, para tanto, habitam e dependem do espaço da cidade. Uma casinha que nos chama os olhos tem toda a chance de ter discretamente inspirado inúmeras pessoas que por ventura ali passaram. E assim, em cada uma das pedras que formam a cidade, por mais frias que sejam, há algo de histórico, de humano e de valioso.

Se a cidade, como quer Mumford (1961), é o laboratório no qual se destila e aprimora a cultura de uma sociedade, então seus centros, nódulos e vias de fluxo são, sem dúvida, os instrumentos principais nessa elaboração. Um cruzamento despretensioso que já testemunhou infinitos acordos e desacordos vale mais para a civilização do que um monumento estéril e indiferente que passa desapercebido e intocado.

São Paulo é um dos principais focos da força econômica e cultural do Brasil. Trata-se de uma cidade enorme, complexa e com uma história que data do início da nossa formação enquanto nação. Ora, é então muito natural que nos interessemos por essa história e, em particular, pelas estruturas urbanas que a testemunhou. Este trabalho investiga uma pequena parte delas.

O objetivo não é fazer uma análise geral e abstrata sobre a cidade, mas sim tomar uma região importante dentro dela para tentar-se compreender, in concreto, como as forças da preservação e do desenvolvimento urbano operam. Esperamos com isso mostrar os problemas e possibilidades com algum detalhe, que só uma análise específica como essa pode fornecer, e assim sensibilizar o leitor para a questão maior do patrimônio urbano.

Nesse sentido recortamos uma região da cidade que acreditamos conter uma forte carga representativa no processo de criação da identidade de São Paulo. A Lapa é um microcosmo no qual diversas questões podem ser estudadas. Buscamos essa compreensão a partir de análises dos agentes modificadores do espaço, a saber: histórico de ocupação da Lapa, legislação atuante existente, casos exemplares no estudo da preservação de bairros (estudo de caso do Pacaembu) e, finalmente, análise mais aprofundada dos elementos configuradores de um espaço que foi reconhecido como portador de identidade de um grupo social específico (estudo de caso da Vila Romana).

Dentro desta última análise tentamos desenvolver uma metodologia que compreendesse as significâncias históricas, sociais, estéticas e econômicas do recorte escolhido, além de apontar os problemas a serem corrigidos e as potencialidades a serem desenvolvidas. O objetivo final é conciliar o desenvolvimento com a preservação, usando os mecanismos legais existentes, sempre justificados por uma demanda social receosa de perder sua identidade em nome do “progresso”. Por isso a importância em se estudar os mecanismos que a legislação oferece hoje e as experiências passadas que servem de exemplo a ser desenvolvido.

De certo modo, entretanto, é impossível decidir a questão sobre o que deve ou não ser preservado, visto que ela depende de um julgamento de valor, coisa para a qual não existe medida objetiva. Ainda assim, qualquer julgamento que se queira emitir depende do objeto sendo avaliado. É, portanto, fundamental ao menos conhecer aquilo que eventualmente será preservado ou destruído. A nossa esperança é de que o conhecimento dos fatos seja capaz de propiciar uma escolha mais acertada por parte de todos os agentes envolvidos na construção desta e de outras cidades, já que não são poucos os erros cometidos simplesmente pela ignorância. Nesse espírito, tentamos aqui sintetizar o que aprendemos ao observar a Lapa e apresentar nossa própria visão do que o equilíbrio entre passado e futuro pode ser.

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