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secao 4!

Criação de cenário para Andorra

Bettina Rose Wolfram

Minoru Naruto

Inicialmente, a proposta deste Trabalho Final de Graduação era desenvolver um estudo sobre a obra cenográfica de Flávio Império, para que, em uma segunda etapa, seus conceitos pudessem ser aplicados ao cenário de uma peça para a qual o artista nunca tenha desenvolvido um trabalho. No entanto, no decorrer da pesquisa, mostrou-se mais instigante elaborar o cenário de uma peça com a qual Flávio Império já tivesse trabalhado, evitando assim transpor suas idéias para o tempo atual e propor uma colagem sem fundamentos de elementos.

Ao longo da pesquisa, chamou-me a atenção a ligação de Flávio Império com o teatro brechtiano e o teatro épico também praticado por outros autores. Em especial, o texto Andorra, de Max Frisch. A montagem de Império é de 1964, para o Teatro Oficina.

Flávio Império, formado arquiteto pela Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo, em 1961, iniciou sua carreira como cenógrafo em um momento de ressurgimento do teatro brasileiro. Dos anos 20 aos anos 50, tanto o teatro, quanto a literatura contavam com contribuições de refinamento estético e com o alargamento da consciência de seu público. Neste tempo, o teatro brasileiro aprimora-se, harmonizando texto, direção, cenografia, figurinos, iluminação e interpretação, dando unidade à obra cênica.Um dos expoentes desta época era o TBC.

A influência do TBC foi além das soluções cenográficas, pois havia também uma preocupação com o conforto da sala, assim como com a infra-estrutura de produção. Isto será o ideal de muitas outras companhias de teatro, porém que o farão em uma escala reduzida, adaptada a sua própria realidade econômica. É neste meio e em uma conjuntura socialista, antiimperialista e nacionalista dos anos 60 que Flávio Império inicia-se profissionalmente. Acontecia aqui uma nova conformação de vanguarda artísticas.

Desde seu 1º trabalho amador, em 1956, para a Comunidade de Trabalho do Cristo Operário, envolve-se com projetos que contemplem a redenção social. Logo após, em 1959, liga-se ao Teatro de Arena. Apesar de não ter conseguido reproduzir o grande aparato físico do TBC, o Teatro de Arena transformou-se em um pequeno núcleo de estabilidade e auto-suficiência. Em um de seus primeiros trabalhos para o Teatro de Arena, em 1959, Flávio Império resolve a cenografia e figurinos de GENTE COMO A GENTE.

O cenógrafo trabalhou também fora do Arena, inclusive em teatros nos quais se defronta com a caixa cênica, como no Teatro Experimental Cacilda Becker. Realiza ali, em 1960, a peça MORTE E VIDA SEVERINA,na qual tentava fundir as idéias de Brecht e do teatro realista, onde aplica a técnica do distanciamento e tenta apresentar ao público paulista a realidade nordestina, que era quase que inteiramente ignorada. Em 1962 realiza dois trabalhos para o Teatro Oficina: UM BONDE CHAMADO DESEJO e TODO ANJO É TERRÍVEL. Nestes trabalhos existe uma crítica à ordem social etambém uma ambientação do realismo psicológico. O cenário proposto está subordinado às exigências do texto, fazendo parte de um trabalho de dominar as convenções cenográficas por parte do artista.

Em 1964, realiza dois trabalhos brechtianos: ANDORRA e ÓPERA DE TRÊS VINTÉNS.

Em 1970, Império realiza seu último trabalho para o Oficina, com a montagem de DON JUAN.

Morre aos 50 anos de idade, tendo grande reconhecimento de seu talento como cenógrafo. Foi além disso artista plástico e arquiteto.

Andorra é um texto escrito pelo dramaturgo suíço Max Frisch em 1961. Trata-se de uma parábola na qual é tematisado o anti-semitismo e o preconceito, através da história de Andri, que é o suposto filho adotivo do professor da cidade. O professor diz ter adotado o garoto para salvá-lo do vilarejo vizinho, no qual não era bem vindo, por ser judeu. Porém, logo descobrimos que o menino é filho ilegítimo do professor com uma mulher. Repleta de personagens estereotipados, o texto mostra como a omissão preconceito de cada um levou à morte de uma pessoa inocente.

A proposta final para este cenário leva em consideração o potencial do espaço de encenação, que pode contribuir com a idéia de que o fato pode ocorrer em qualquer lugar, em qualquer hora. Todos os painéis foram separados e têm alturas e larguras diferentes. Isto dá a sensação de instabilidade, de concorrência por espaço, de cidade contemporânea. Estes painéis possuem estrutura de perfil metálico, que sustenta a tela mosquiteiro e também uma grelha, posicionada atrás da tela. Com a luz, teremos a transparência das telas, mas ainda veremos a grade, algo que estrutura, mas também simboliza a cidade fechada por muros e cercas.

O praticável central é de vidro blindex 3mm, sustentado pela mesma estrutura metálica dos painéis. A escolha do vidro deve-se por ser um material extremamente contemporâneo, muito presente na cidade, mas aqui, também representa um patamar que não se vê. A idéia é que, em determinadas cenas, alguém suba neste praticável, colocando-se mais alto do que o judeu. Porém, aparentemente a personagem flutua. Toda a estética adotada remete a esta cidade em vivemos. É a cidade que funciona como uma imagem, é apenas uma projeção da qual estamos longe, que não podemos tocar. A transparência talvez remeta ao modernismo, pois vemos a estrutura desta cidade, mas também é a morte do modernismo, a morte dos sonhos e ideais, da esperança. É apenas uma projeção do que já foi. Apenas uma imagem.

Seguindo as idéias de Império e do próprio Frisch, esta cenografia não terá objetos em cena, além dos essenciais, como os sapatos de Andri no final ou a jukebox. A diferença de local da cena se fará principalmente pela luz. Os postes, propositalmente menores que os painéis, para dar a eles um aspecto ainda maior e assim apresentarem um lugar opressivo e temeroso, são a principal iluminação. Para as cenas da praça e estalagem, todos os postes se acendem. Já para as cenas da casa de Andri, da oficina e da igreja, apenas os postes que focalizam a cena estarão acesos.

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