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secao 4!

Arquitetura da Cena

Vendaval nas Caldeiras

Carolina Catelan Gonzalez

Sérgio Régis Moreira Martins

O foco do trabalho deste TFG era unir teatro e arquitetura. Escolhi para isso a Casa das Caldeiras, onde pude desenvolver um trabalho de exploração entre Julho e Novembro de 2010. Ao lado da atriz e bailarina Sandra Flores, pensamos a Casa das Caldeiras como tema, fonte e suporte do trabalho, aproveitando a oportunidade rara na cidade de encontrar um espaço que abra as suas portas para a pesquisa, dando mais importância ao processo dos artistas que ao resultado.

Buscamos criar uma performance cuja dramaturgia seria feita de forma colaborativa, tendo como material de base a história da Casa, a sua materialidade e o trem que passava ao lado. As inspirações vinham também de outros grupos de teatro. A influência principal era o Teatro da Vertigem, que além de termos visto seus espetáculos, pudemos em 2001 fazer duas oficinas com seus atores. Foi então que entramos em contato com a Criação Colaborativa e o Ator-Criador. Esse tipo de trabalho influenciou o nosso grupo Cia 3x4, que existiu de 2001 a 2008. O Grupo XIX de Teatro é outra influência, pois também trabalha com a criação dramatúrgica e cênica feita por todos os seus integrantes através de pesquisas históricas. Ambos os grupos trabalham em espaços não-convencionais, podendo fazer de um hospital, um presídio, um rio, uma casa antiga ou as ruas de uma vila operária o cenário e, também, a inspiração de seus trabalhos.

Nesse TFG, eu e a Sandra pesquisamos as linhas de trem que passavam atrás da Casa ( São Paulo Railway e Sorocabana), a história da Casa das Caldeiras e das Indústrias Matarazzo e as intervenções do ARTE/CIDADE (que em 1997 usou o terreno das antigas IRFM e a Casa das Caldeiras). Trabalhamos com improvisos pelos espaços deixando que o lugar influenciasse a construção da cena.

Também tínhamos alguns elementos que queríamos explorar nesse processo. Um deles era o ator-criador e o processo colaborativo, onde o ator não é subordinado às decisões do diretor. Ele é também um criador da cena, da dramaturgia, do espetáculo, da iluminação, da trilha-sonora. Ele é um ator/autor. Não é como nos anos 70, onde todos faziam tudo. Aqui as funções ainda existem, mas perde-se a hierarquia rígida do teatro tradicional.

Outro aspecto importante é a criação dramatúrgica, feita a partir do espaço da Casa das Caldeiras e da pesquisa histórica com todo o material que o próprio espaço sugeria. O texto, assim, não veio antes que o lugar, mas surgiu com ele e para ele.

A memória também foi um elemento importante, visto que a própria materialidade da Casa já nos remete ao passado.

O mundo feminino esteve presente no trabalho, não apenas porque éramos duas atrizes trabalhando juntas, mas também era um assunto que nos interessava desde 2001. E não falo do feminino como gênero apenas, muito embora isso também esteja presente. Falo do seu aspecto simbólico, que trata de receptividade, intuição, sensibilidade, suavidade, espera.

O espaço era fundamental na nossa criação. O fato de trabalharmos fora da caixa preta do teatro traz outras questões. Os espaços não-convencionais fazem com que tenhamos de pensar na posição que o espectador vai ocupar. Em geral, esses espaços nos obrigam a reduzir o número de espectadores, assim, com a proximidade que o espaço gera entre ator e público, novas relações podem ser estabelecidas.

O espectador vira uma peça central da ação cênica. A cada dia tem-se um novo espetáculo, pois é um novo público. E ele não fica escondido na penumbra, acomodado confortavelmente em sua cadeira, assistindo com neutralidade a cena. Ele se insere na ação, pois ele vê e é visto. Ele participa. Como o ator direciona o seu olhar ou seu gesto a uma pessoa em particular, não se trata de uma massa de espectadores, mas de uma individualidade. A participação do espectador pode acontecer de diversas maneiras: desde a simples presença na composição da cena, passando pela participação controlada, podendo chegar à efetiva interatividade.

Com esse espectador/participador tão próximo, podemos pensar em estimular outros sentidos além da visão e da audição, que são os principais no teatro tradicional. Pode-se explorar o tato, o paladar, o olfato, amplificando os sentidos e mergulhando o espectador em uma atmosfera, tocando-o, não apenas pela compreensão racional, mas pela sensibilidade.

Tendo esses elementos por base, trabalhamos por 4 meses e meio na Casa das Caldeiras, explorando e criando. De cenas soltas, chegamos a uma estrutura com começo, meio e fim que apresentamos no dia 15 de Novembro: a performance Vendaval.

Porém esse TFG não se trata apenas do resultado. O mais importante, a meu ver, foi o processo criativo de construção da cena a partir do espaço e das experimentações. Preocupei-me em mostrar as etapas, as mudanças entre o desejo inicial e a forma tomada pelo trabalho, pois é esse o verdadeiro aprendizado, já que a obra se dá na sua materialização.

Assim, apesar de apresentar o resultado, seus elementos, e fazer uma anàlise e avaliação da apresentação (o que se encontra principalmente no Caderno Vendaval), também quis deixar registradas as pesquisas temáticas e uma espécie de diário do processo, para mostrar todo o caminho, muitas vezes tortuoso, que percorremos na criação desse projeto artístico.

Espero que esse trabalho possa abrir uma fresta para que as pessoas façam uma viagem no tempo e olhem para o patrimônio da Casa das Caldeiras de outra maneira. Não são apenas tijolos, mas memórias guardadas em suas paredes.

FICHA TÉCNICA

Concepção Geral, Dramaturgia, Interpretação: Carolina Catelan e Sandra Flores
Trilha Sonora escolhida por Carolina Catelan e Sandra Flores com músicas de Erik Satie, Philip Glass e Handel
Fotografias: Livia Lazaneo, Renata Veloso e Rita Wu.
Imagens e Edição: Diógenes S. Miranda.
Apoio: Associação Cultural Casa das Caldeiras e Audiovisual FAU-USP.

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