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secao 4!

Solidão na Metrópole

Ana Luiza Lacerda Coelho de Paula

Clice de Toledo Sanjar Mazzilli

“Solitários, uni-vos!” E nada mudou.

O famoso slogan político vindo do Manifesto Comunista de Karl Marx e Friedrich Engels, aquele que fazia um chamado aos trabalhadores, surtia efeito numa época em que as corporações, instituições e até mesmo a religião, ainda tinham, cada um com seu determinado público, a capacidade de unir as pessoas em prol de um mesmo interesse.

Quando nos deparamos, no início do século XX, na pós-modernidade, com uma multidão de pessoas desconectadas entre si, ensimesmadas, esse chamado parece não tocá-las. As pessoas estão muito próximas fisicamente, porém com interesses muito distantes e distintos. A individualidade que gera o individualismo. O individualismo que gera a solidão.

O presente trabalho vem justamente discutir o “sentir-se sozinho em meio à multidão”, tendo como cenário a metrópole. Como a paisagem e a dinâmica das cidades grandes, interferem ou colaboram para esse distanciamento que pode ser físico, no caso das pessoas pelas quais possuímos vínculo afetivo ou, pelo contrário, no caso de pessoas fisicamente próximas e afetivamente muito distantes, alheias umas às outras.

O resultado dessa reflexão foi expresso em imagens por meio da animação, representação essa que reúne elementos da própria metrópole tanto nas imagens quanto na trilha sonora. Cenas cotidianas aos olhos de um solitário. Quando pensei em um produto para meu TFG, após refletir um pouco, cheguei à conclusão de que fazer uma animação seria uma boa opção. Já havia tido essa experiência em uma matéria que cursei no meu intercâmbio, na Alemanha, cujo trabalho deveria ser um vídeo. Apesar da sugestão inicial dos professores ser a produção de um filme editado, minha dupla e eu optamos pela animação, pois ela nos permitiria expressar algo além do real. Poderíamos interferir livremente mesmo em paisagens pré existentes.

Como nenhuma de nós tinha experiência com animação, procurei aprender o básico do Flash e conseguimos em poucos meses concluí-la. Foi um processo muito trabalhoso, porém extremamente gratificante:, vermos os elementos ganhando movimento e interagindo entre si, de maneira que pudemos expressar nosso conceito.

Para o presente trabalho, ao buscar referências, percebi que quando procurava por "animação" apareciam muitas coisas sofisticadas e foi difícil achar trabalhos que utilizassem a linguagem que eu me propunha a utilizar. Para evitar confusões com animações 3d, ou desenhadas frame a frame optei por chamar meu trabalho de "projeto gráfico em formato audiovisual". Meu objetivo era me expressar através da animação, porém sem me prender ao desenho.

Esse TFG foi dividido em duas etapas. No primeiro semestre dediquei-me à pesquisa teórica sobre o tema solidão na contemporaneidade e também à pesquisa de referências visuais, nas artes plásticas e audiovisuais. Autores como Bauman, com o livro Modernidade Líquida e Sérgio Laje com sua dissertação : Lonely Sweet Home foram minhas principais fontes bibliográficas. Através dessas obras tive contato também com outros autores nelas citados. O segundo semestre de TFG, então, consistiu na elaboração do roteiro e da execução do vídeo em si.

As referências visuais se iniciaram nas artes plásticas. Edward Hopper é um exemplo de artista que traduziu visualmente a solidão nas metrópoles. Através de seus quadros, o artista realista, ilustra cenas de pessoas sozinhas. Apesar de ser uma referência visual, para esse trabalho, o tema de sua obra foi muito mais relevante do que a técnica que ele utiliza.

Como a idéia inicial desse TFG consistia na realização de um trabalho audiovisual por meio de fotomontagem, elegeu-se a Collage como tema de pesquisa de linguagem visual. Para tanto, em um primeiro momento, procurou-se referências diretas de artistas que utilizavam essa técnica, e em seguida, sentiu-se a necessidade de fazer uma pesquisa histórica sobre o desenvolvimento dessa técnica através de determinados movimentos artísticos como o Cubismo e Dadaísmo.

Durante o processo de animação, porém, a linguagem que se buscava inicialmente sofreu diversas modificações, mas ainda assim, podemos encontrar referências ao universo da junção e sobreposição de diferentes elementos no produto final aqui apresentado.

Dentro da ampla pesquisa realizada na área de audiovisual, o canal “Youtube Play” foi a maior fonte de referências, pois apresentou centenas de curtas envolvendo animação com as mais diferentes propostas. Através de um olhar global sobre toda a produção disponibilizada nesse canal, foram selecionados alguns vídeos que se aproximavam mais da temática ou da linguagem aqui propostas. Dentre esses filmes, o Frame of Imagination foi a grande referência, principalmente em termos de linguagem, durante o início do desenvolvimento desse trabalho.

A partir das primeiras experiências com materiais caseiros e memórias (todas as cenas em minha mente vinham do cotidiano e das imagens diárias das redondezas da minha casa, próxima a Avenida Paulista), saí com uma câmera fotográfica simples, dessas que filmam também, em busca de seqüências interessantes. Não com o intuito de usá-las diretamente no trabalho, mas de que pudessem me ajudar no estudo do movimento, a sucessão de suas imagens, destrinchando-as frame a frame para que pudesse achar ali imagens mais exatas, e ao mesmo tempo, mais espontâneas do que se as tivesse fotografado uma por uma.

O trabalho de roteiro e a escolha da linguagem evoluíram juntos.

Comecei por uma sucessão de cenas que fazem parte do meu dia-a-dia e que caberiam muito bem em um roteiro para ser filmado. Mas a questão da linguagem, que passou de animação com foto-montagem para união de elementos de forma mais abstrata e solta, formando eles próprios o cenário, me levou a tornar esse roteiro menos linear e também mais solto.

Já no primeiro roteiro, senti a necessidade de colocar uma introdução, que precederia o próprio título do filme, onde seria contada a história da metrópole, de maneira lúdica aos que aqui chegaram sem saber como todo esse caos foi estabelecido. Esse primeiro roteiro e suas cenas enumeradas deram origem ao texto reproduzido abaixo. Este texto, por sua vez, resultou em uma segunda versão de roteiro. E assim como a linguagem, ele se tornou também menos linear e mais fluido. O roteiro final manteve a estorinha da formação da metrópole em sua introdução, com cenas mais figurativas. Já na segunda parte do vídeo, os detalhes específicos da metrópole foram predominantes - muitas vezes e, inevitavelmente, representados por elementos da cidade de São Paulo. Busquei despertar um lado mais sensitivo no espectador através de sons e imagens familiares que remetem a momentos introspectivos mesmo em meio à multidão.

A história se passa em uma metrópole não identificada, qualquer semelhança com São Paulo é mera coincidência. A superfície da lua é um lugar inóspito, árido, pouco convidativo e com muito pouco a oferecer a quem pretende ter uma vida social animada. Mas aqui não é a lua. Vejam! Quantos prédios, e quantos carros, e quanto barulho, e quanto..lixo ?! Onde viemos parar?! Onde EU vim parar?

Metrópole / Solidão na (Metrópole)

À espera para atravessar a rua. Começa a chover, um guarda-chuva se abre. Em meio aos pingos e trovões os prédios se multiplicam, tomando a tela inteira. O guarda chuva se vai. A imagem verticalizada se converte a um poste com o sinal de pedestres no vermelho. Um ônibus passa e pode-se ver através de suas janelas, que o sinal ainda está vermelho.

O sinal fica verde, a faixa de pedestre atravessa até o outro lado da avenida. Cruza com sombras de pedestres. Na calçada do outro lado, caminha pelos mais diversos pisos. Os passos se revezam, cruzam com outros, pulam poças e atravessam sombras. Pernas que vão se aglomerando. Chega-se ao vagão do metrô. No metrô muita gente, muitos pés na verdade. Não se sabe de quem são. Vêem-se através das janelas muitas cores. Muita informação, propagandas: celular, computador. A tecnologia!

O celular está na mão de um pedestre: "Hoje não vai dar." As pessoas são sinais humanos no vermelho.

A roda do ônibus tenta rodar, e por mais que rode, nunca roda o suficiente para se fazer uma visita. O sinal do celular já foi e voltou. A informação está transmitida, mas será que a comunicação está realmente estabelecida? Falha na conexão. Estamos off line. Através da janela do ônibus podem-se ver as janelas dos apartamentos acesas.

A solidão libertadora dentro da caixinha de fósforo. Aqui dentro faz eco. Pessoas vermelhas viram sombras e dizeres retirados do twitter são publicados.

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