logofau
logocatfg
secao 4!

Brasília:

uma metáfora que não se realiza na história

Carime Thomazini André

Rodrigo Queiroz

Desde o início do desenvolvimento deste trabalho final de graduação, já no primeiro semestre da disciplina, tinha como proposta a elaboração de um curta-metragem sobre a cidade de Brasília.

O objetivo não era realizar uma análise meramente arquitetônica sobre a construção da nova capital do país, mas resgatar os princípios contidos no Plano Piloto de Brasília enquanto símbolo de um futuro possível não só para arquitetos e urbanistas, mas para toda uma geração.

Foi nesse sentido que defini o título deste trabalho.

Retomo-o de um trecho do roteiro de A idade da Terra (1980), longa-metragem rodado naquelas que foram as três capitais do país (Salvador, Rio de Janeiro e Brasília). Nesse que foi o último filme do cineasta brasileiro Glauber Rocha, encontramos a seguinte afirmação:

"Aqui, por exemplo, em Brasília, este palco fantástico no coração do planalto brasileiro, fonte, irradiação, luz do Terceiro Mundo, uma metáfora que não se realiza na história mas preenche um sentimento de grandeza, a visão do paraíso [É]. Brasília é o Eldorado, aquilo que os espanhóis e outros visionários perseguiam."
[G. Rocha, em off]

Brasília não foi capaz de superar as contradições da cidade capitalista. E não poderia. Por isso permanece, como afirmou Glauber Rocha, enquanto uma metáfora cravada no coração da América - continente sem (e além) dos resquícios medievais da Europa -, uma "metáfora que não se realiza na história".

Partindo desta análise, desenvolvi o roteiro do curta-metragem, onde as imagens, sejam aquelas da época da construção de Brasília, da cidade consolidada ou que fazem referência a outros filmes, foram estruturadas a partir da trilha sonora, concretizando um trabalho de aproximadamente 15 minutos sobre o legado e os limites aos quais a nova capital do país está submetida.

O desenvolvimento do curta-metragem

Decidi estruturar o curta "Brasília: uma metáfora que não se realiza na história" a partir da sua trilha sonora. As imagens e depoimentos utilizados foram todos extraídos de outros filmes, documentários e reportagens pesquisados.

A trilha sonora é formada por três composições:
A) Tropicália, de Caetano Veloso
B) Brasília, sinfonia da alvorada, de Tom Jobim/Vinícius de Moraes
C) Bachianas brasileiras n.5: ária (cantilena), de Heitor Villa-Lobos

O vídeo começa com a música Tropicália, intercalada com imagens do início do filme Terra em transe (1967), com o intuito de mostrar uma anunciação e uma referência à fictícia Eldorado de Glauber Rocha. Enquanto ouvimos "Quando Pero Vaz de Caminha descobriu que as terras brasileiras eram férteis e verdejantes, escreveu uma carta ao rei: tudo que nela se planta, tudo cresce e floresce. E o Gauss da época gravou [...]", vemos a chegada no continente, aqui entendido como o continente americano. Logo em seguida, ouvimos o depoimento de Oscar Niemeyer:
"Lá na Europa, eles diziam: 'O passado arquitetônico de vocês é pobre. É mais português do que brasileiro'. E eu dizia que isso é muito bom para nós, porque vocês vivem circulando entre monumentos e nós estamos livres para fazer hoje o passado de amanhã."

Nesse momento ocorre a transição musical para a primeira parte da Sinfonia da alvorada (O planalto deserto), que é intercalada com imagens do cerrado brasileiro - registradas pelo designer norte-americano Eugene Feldman durante sua visita à Brasília em 1957 - e depois pela imagem da pedra fundamental da nova capital, que foi assentada no dia do centenário da Independência do Brasil (7 de setembro de 1922). No mesmo momento, entra o depoimento de Lúcio Costa:
"Brasília nasceu do gesto primário de quem assinala um lugar e dele toma posse. Ou seja, o próprio sinal da cruz."

Ele faz a transição para a segunda parte da Sinfonia (O homem), onde imagens de Lúcio Costa, Oscar Niemeyer e de maquetes dos edifícios de Brasília são intercaladas com trechos do filme Fitzcarraldo (1982), cujo personagem principal tinha o sonho de construir uma casa de ópera em plena Amazônia.

Na terceira parte da Sinfonia (A chegada dos candangos), há uma tomada única, primeiro externa e depois interna, do ônibus Recife-Brasília, sinalizando a chegada de novos trabalhadores à capital. Ouvimos também o depoimento de um dos pioneiros da construção da cidade:
"Lá no Nordeste a pobreza está além do possível. A pobreza está tamanha que o pessoal está saindo assim desesperado, porque não existe nenhum apoio. Não tem apoio na lavoura, não tem apoio na cidade. Então eles preferem vir pra Brasília ainda na base da esperança."

Na quarta parte da Sinfonia (O trabalho e a construção), há primeiro uma sequência de imagens da construção de Brasília e depois, acompanhando os arranjos musicais, a transição para a cidade já consolidada, que é feita através da imagem da descida de uma das escadas rolantes na rodoviária da cidade, onde os dois eixos - o monumental e o rodoviário-residencial - se cruzam. Nessa parte do curta-metragem, ouvimos o depoimento de um provável morador de Brasília:
"Lugar nenhum do mundo lembra Brasília. Qualquer lugar do mundo lembra algum lugar, mas você não encontra Brasília em lugar nenhum. Brasília é um lugar onde você vê a noite nascer e morrer."

Para a última parte do curta-metragem, escolhi a composição Bachianas brasileiras n.5: ária. É nesse momento - após a anunciação das potencialidades do continente americano e de Brasília em particular - que aparecem as contradições da cidade. Contraponho a fuga do ator Jean-Paul Belmondo pelos espaços livres da capital à do soldado que guarda o Palácio do Planalto (que, apesar disso, não deixa de revelar toda a poesia da sua perspectiva em movimento), além de um dos edifícios da Universidade de Brasília à invasão do campus pelas tropas do exército em 1968 e, por fim, as superquadras às casas populares do Banco Nacional de Habitação (BNH) e às cidades-satélites.

A escolha do primeiro momento das Bachianas n.5, denominada ária (cantilena), se deu porque ela remete, intuitivamente, a um movimento contínuo onde as notas sobem, como que querendo alcançar algum lugar, e depois descem, retornando sempre àquele momento de partida, que se queria deixar para trás.

slideshow image

If you can see this, then your browser cannot display the slideshow text.

 

topo