Este trabalho é fruto de inquietações presentes ao longo de praticamente todo o processo de minha graduação, fruto da observação e reflexão sobre o processo projetual: será que nós aprendemos de fato, a fazer uma leitura da cidade? Em que medida nossas respostas projetuais refletem as reais necessidades do local em que este irá se inserir? Nós, arquitetos, também não tendemos a dar respostas pré-prontas aos problemas urbanos? Em que medida os inúmeros projetos malsucedidos em nossas cidades não são frutos de uma falha no processo de leitura dos espaços urbanos?
A cidade se apresenta como palco de inúmeros acontecimentos simultâneos, no entanto, com a correria do cotidiano vários deles passam despercebidos por nós.
O intuito deste trabalho é mostrar - a partir de imagens - o quão rica e diversificada pode ser a experiência em um determinado lugar, desde que nos permitamos experimentar a cidade de forma mais profunda, com um olhar desautomatizado e atento aos detalhes.
O produto dessa análise foi desenvolvido na forma de um livro-imagem, tendo como inspiração cenas urbanas retiradas da experiência realizada no bairro do Bexiga, em São Paulo, local escolhido por apresentar uma grande diversidade e riqueza de questões urbanas atuais.
Desde o início, pretendi explorar diferentes percursos, retratados a partir de imagens, que traduzissem a minha percepção sobre o bairro, mostrando a diversidade sociocultural do Bexiga, suas peculiaridades e características que nem sempre são conhecidas.
Além de fazer esse mapeamento do bairro, traduzindo os diversos aspectos que se sobrepõem naquele local, também pretendi com este trabalho, destacar a importância de se vivenciar a cidade, conhecer bem suas particularidades para desenvolver um projeto realmente adequado às necessidades do local, o que mesmo atualmente, parece ser esquecido em alguns momentos.
O resultado dessa análise é apresentado na forma de um livro-imagem. O livro-imagem tem como objetivo a quebra da forma convencional do livro, as imagens são preponderantes em relação ao texto, que inclusive, pode estar ausente. A leitura é realizada por meio de palavras soltas ou sentenças curtas e também através da interpretação pessoal das imagens.
Optei por esse tipo de suporte por parecer mais adequado ao trabalho que gostaria de desenvolver, já que é predominantemente visual, empregando fotografia e outras técnicas de representação em composições gráficas.
O trabalho foi desenvolvido a partir de saídas de campo, em que foram realizados percursos pelo bairro fazendo levantamentos fotográficos e através de desenhos, carimbos e colagens, buscando retratar as características do bairro em questão.
Após esse levantamento, as imagens foram agrupadas pelos temas que gostaria de abordar, observados na minha vivência do bairro e definidos anteriormente: 1. Conflitos (tradicional x moderno); 2. Degradação; 3. Carências; 4. Tradição (cultura, festas). Depois foram selecionadas e organizadas segundo a temática abordada no livro-imagem.
Em seguida, passei a realizar experimentos gráficos, utilizando fotografias e as imagens resultantes dos carimbos e colagens. Inicialmente, foco das composições eram os detalhes de gradis e outros elementos retirados do bairro, trabalhados na forma de carimbos e formando composições digitais juntamente com as fotografias.
Optei por trabalhar predominantemente com as fotografias, já que o meu objetivo desde o início era o de retratar cenas urbanas do bairro do Bexiga, ou seja, para mim era muito importante que o leitor pudesse identificar alguns locais do bairro conforme fosse virando as páginas do livro.
Além da fotografia, as técnicas utilizadas foram os carimbos vetorizados e os grafismos trabalhados digitalmente (Adobe Photoshop, Illustrator). As páginas foram elaboradas no programa Adobe Illustrator.
Foi estabelecido um formato para o livro (aberto 20 x 32 cm, fechado 20 x 16 cm) e as composições foram trabalhadas em páginas duplas, por possibilitarem maior liberdade na hora de dispor imagens e textos.
Cada página dupla foi trabalhada como uma única imagem, portanto, uma encadernação costurada tradicional não seria indicada. Optei por fazer uma encadernação artesanal, em formato sanfona, possibilitando uma leitura contínua, ou da forma tradicional, folheando página por página.
A construção da narrativa foi pensada de maneira cronológica: as páginas iniciais são dedicadas às imagens relacionadas às tradições do bairro, passando em seguida para as imagens do que é visto no bairro atualmente, mostrando os usos e também os conflitos e degradações presentes na região.
As cores utilizadas nas composições foram retiradas do próprio local, como por exemplo, as cores encontradas nas fachadas das edificações. Utilizei principalmente, tons de amarelo, azul, verde e vermelho. Nas páginas que se referem às degradações e conflitos, procurei usar cores mais neutras, principalmente os tons de cinza.
O livro é composto por 40 lâminas; a impressão do miolo foi feita em papel couché fosco, 95 g. A encadernação é artesanal do tipo sanfona, frente e verso, colado sobre estrutura sanfonada de papel canson marquer para desenho. Capa dura feita em papel cartão encapado com papel contact.
Uma dificuldade enfrentada durante a confecção dos exemplares do livro foi a falta de profissionais que realizassem o tipo de encadernação que eu havia definido. Por não ter encontrado uma alternativa de encadernação junto às gráficas, precisei desenvolver artesanalmente cada um dos exemplares, desde um esquema de montagem até a escolha dos materiais.
As imagens que compõem as páginas do livro são todas retiradas de cenas do próprio Bexiga e compreendem, principalmente, os usos do espaço, as tipologias edificadas, as tradições, conflitos e degradações presentes na região.
