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secao 4!

Passagens na cidade

Luisa Magni Fecchio

Luís Antônio Jorge

O tema deste trabalho surgiu a partir de um estudo sobre as passagens cobertas parisienses realizado durante meu intercâmbio em Paris. Essas passagens me atraíram por sua complexidade, suas misturas e permanências, era sua ambiência e sua poética urbana que fizeram me aproximar desses objetos. O nome passagem se referia às ruas internas às quadras, as quais conectavam duas ruas movimentadas e eram cobertas por vitrais faceados dos dois lados por lojas. Eram nelas que o comércio de varejo de organizava, nesse espaço público em terreno privado, onde os pedestres podiam caminhar protegidos das intempéries.

Tendo isso em vista, achei que seria interessante estudar no Trabalho Final de Graduação alguma situação em São Paulo com a mesma complexidade e riqueza das passagens parisienses. Pude me deparar com alguns casos com concentração de galerias, mas o que mais me chamou a atenção foi a região do Centro Novo, área compreendida entre a Praça da República, Vale do Anhangabaú, Avenida São João e a Rua da Consolação. Nessa região relativamente pequena pode-se encontrar 21 térreos permeáveis, galerias que por sua permeabilidade e proximidade formam um sistema de espaços para o pedestre, tanto para o deslocamento quanto para a permanência e o encontro.

Essas galerias foram construídas no Centro Novo principalmente nos térreos de edifícios modernos e entre as décadas de 50 e 60. Durante a primeira metade do século XX, a cidade de São Paulo passou por um grande desenvolvimento econômico que acabou por acarretar transformações tanto culturais quanto espaciais, sendo o Plano de Avenidas de Prestes Maia o maior fator gerador de mudanças no centro de São Paulo. Além da abertura e alargamento de vias, através da legislação ele incentivava a construção de grandes edifícios que marcassem a paisagem e também incentivava a permeabilidade em seus térreos, uma vez que instituía que os prédios com mais de 20 andares deveriam possuir reentrâncias e arcadas em seus embasamentos.

Esses embasamentos ainda hoje desempenham uma importante transição entre a escala do pedestre e da metrópole, ao criar essas ruas internas com pés direitos mais baixos, átrios e painéis eles tornam os térreos mais agradáveis para os transeuntes, enquanto os arranha-céus ficam sobre eles sem possuírem uma relação direta com aquele que passa pelas calçadas. Ao formarem essa trama unida de vias para o pedestre e ao fornecer um caminho mais calmo, mais ameno e mais tranqŸilo, as galerias acabam também por humanizar as ruas e tornara-la mais atrativa para o transeunte. A arquitetura moderna com a separação entre estrutura e vedação foi um dos fatores que contribuíram para o desenhos de térreos com relações mais interessantes com a rua e seu entorno.

A grande quantidade de pessoas que trabalhavam, habitavam e se deslocavam pela região foi um dos motivos do sucesso dessas galerias, uma vez que essa massa trazia a vida das ruas para dentro das galerias transcendendo a divisa entre o publico e o privado, dando ênfase para a importância do espaço público.

Foi com a intenção de compreender melhor esses espaços que realizei um grande número de visitas às galerias do Centro Novo. O Andar por elas e o contato físico teve extrema importância para a minha percepção e para o desenvolvimento do trabalho, que desde o início possuiu uma vontade de leitura e tradução desse sistema de galerias. Tradução que desenvolvi através da cartografia com a marcação de meu percurso com costuras e através de meus registros fotográficos.

Foi observando minhas fotografias que me deparei com as fotos das vitrines, elas me instigaram por seu potencial narrativo, por sua grande variedade e quantidade de detalhes. E assim, por funcionarem como janelas para diferentes microcosmos, me dediquei ao registro dessas vitrines procurando formar um mosaico representativo da vida das galerias. Pude perceber que os personagens das fotos eram tão parte das galerias quanto suas lojas e sua arquitetura e assim procurei registra-los nas fotografias.

As vitrines das galerias do Centro Novo são diferentes das que normalmente temos em mente quando pensamos na palavra vitrine, elas não possuem uma grande preocupação com a estética da exibição dos produtos. Muitas vezes as lojas são diretamente abertas para os corredores, sem um dispositivo para expor seus produtos, possuindo por vezes apenas balcões, apenas panos de vidro, ou mesmo a ausência destes. Essas características somadas às pequenas dimensões das lojas fazem com que aquele que passa pelas galerias acabe tendo uma grande apreensão do que ocorre dentro dos estabelecimentos.

É interessante notar como muitas das lojas existem desde a construção das galerias e como em muitas delas pode-se encontrar objetos de uma passado que parecem tomar conta da ambiência das galerias como um todo. Existem alfaiates, relojoeiros, costureiras, lojas de armações de óculos antigos, lojas de máquinas de costura, de vinis entre outras. Foi por esse tom analógico que escolhi utilizar uma câmera também analógica para realizar meus registros, além disso preferi o uso do filme preto e branco buscando evidenciar as formas, os contrastes e sutilezas de luz. Para destacar as diferenças e também as relações entre as vitrines mantive sempre um quadro fixo na moldura das lojas, deixando de fora elementos exteriores às lojas de maneira a descolar a vitrine de sua localização em uma galeria específica e assim dar a impressão de todas pertencem a uma grande galeria.

Tendo em vista todos esses pontos, organizei a apresentação deste trabalho em três partes: as galerias, o percurso e as vitrines. Com a primeira busco contextualizar historicamente as galerias e evidenciar suas características e qualidades. Na segunda, trato da importância do percorrer e do andar para o entendimento de um lugar e apresento meu percurso durante os dois semestres de trabalho. E por fim, dedico a terceira parte para uma abordagem mais "criativa", através da fotografia das vitrines levo o leitor à flanar pelas galerias e à descobrir suas peculiaridades e suas riquezas.

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