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secao 4!

Museu Precário Albinet|

Thomas Hirschhorn, Jamac e Paredes Pinturas|Mônica Nador: arte, cidade, precariedade.

Berta de Oliveira Melo

Vera Pallamin

O ponto de partida desse trabalho foi o desejo de estudar possíveis relações entre arte e periferia. A escolha dos objetos de estudo possibilitou desde o início refletir sobre a teoria relacionando-a diretamente com a prática. Dessa maneira, o Museu Precário Albinet e o Jamac funcionam como porta de entrada e matéria-prima para uma discussão mais ampla, presente nos discursos de Nador e Hirschhorn.

Arte, cidade e precariedade são os principais temas de interesse dessa análise, que perpassam a obra desses artistas e configuram, ao mesmo tempo, o pano de fundo e o alvo da pesquisa. Logo no começo do trabalho me confrontei com a dificuldade de tentar falar sobre esses temas isoladamente, o que resultava em uma abstração sempre simplista, a meu ver. Entendi que era mais frutífero não abordá-los diretamente e, sim, utilizar como intermédio os estudos de caso, pois assim se revelaria a complexidade das relações imbricadas nos projetos.

Por se tratarem de obras de arte muito diferentes entre si, esse trabalho estruturou-se em três partes distintas na qual as duas primeiras analisam separadamente cada caso para, na terceira, articulá-los. Essa organização mostrou-se necessária, pois a simples apresentação dos projetos não possibilitava criar um campo comum suficiente para desenvolver uma apreensão abrangente, compreensiva. A principal razão disso está na natureza muito diversa entre uma experiência e outra, de modo que as aproximações fazem sentido apenas a partir dos discursos e afirmações que essas obras carregam. É como se ambos se encontrassem nas suas profundezas. Portanto, foi preciso primeiro fazer uma análise detalhada de cada uma, capaz de trazer à tona similaridades e coincidências de referências e temáticas que possibilitassem uma análise transversal desses projetos.

É importante salientar que foram priorizadas as questões que aproximam os dois artistas. Assim, certos aspectos relativos às principais distinções foram citados, mas não tanto esmiuçados, pois tenderiam a desviar o foco dessa análise. Esse é o caso, por exemplo, das diferenças de contextos, tanto do ponto de vista político – nos diferentes papéis que o poder público brasileiro e francês assumem – quanto urbano – nas diferenças estruturais do que significa periferia em São Paulo e em Paris. Assim então, foi preferido ao invés de se deter nas particularidades de cada caso, utilizar os aspectos mais abrangentes da arte contemporânea, da cidade e da precariedade a fim de articular o discurso dos dois artistas concomitantemente, lado a lado na medida do possível.

Os principais pontos de aproximação encontrado nos discursos dos artistas e suas obras analisadas foram:
• arte como abertura ao desconhecido, onde os artistas vão ao encontro do Outro, para juntos criar algo em comum, assim a arte se dá nessa experiência do confronto do eu e o Outro.
• engajamento dos participantes e do artista é fundamental nessas obras.
• ir além do circuito convencional artístico.
• fazer arte para um público não-exclusivo.
• arte que pretende transformar a vida a partir da alteridade.
• arte com posicionamento político.
• trabalhos na periferia tratam e tematizam a precariedade.
• uso de técnicas e materiais simples e do universo cotidiano para poderem ser facilmente manuseados.
• relação conflituosa com a mídia: por um lado divulga o trabalho, por outro distorce afirmações fundamentais dos artistas.

Observa-se ainda a ausência de uma finalização de caráter conclusivo, pois a terceira parte, de articulação, faz o papel de arrematar a análise, construindo uma conversa entre essas duas obras. Essa escolha parte do desejo de não tentar encerrar a discussão, mas deixá-la em aberto assim como as reverberações das próprias obras de arte. No entanto, o último ponto de articulação não deixa de funcionar como um encerramento, afinal, apresenta a participação desses dois artistas na 27ª Bienal de Arte de São Paulo e, assim, pode-se perceber que não foi apenas nesse Trabalho Final de Graduação que a obra de Mônica Nador e Thomas Hirschhorn puderam “viver juntos”.

A inquietação que traz à tona essa análise por meio desses dois artistas é sobre a possibilidade da arte ampliar as perspectivas e se tornar um campo de experimentação de outras possíveis realidades. A vontade de Hirschhorn e Nador de transformar a vida com seus trabalhos a partir das relações humanas leva, a meu ver, consequentemente à transformação das cidades. Assim, a própria cidade é colocada em questão dentro do campo artístico, como exemplificado nas citações dos próprios artistas e da curadora Lisette Lagnado.

“Eu achei que era necessário manifestar a importância que pode ter a arte para transformar a vida com um “projeto manifesto”. Eu acho, é um fato, que a arte pode, a arte deve, a arte quer transformar, não tendo medo de dizer, mudar a vida. (...) Eu quero construir com materiais simples e rápidos de edificar um Museu, um lugar que possa acolher obras originais de artistas, os quais eles mesmos através do seu trabalho quiseram e mudaram a vida. (...) é indispensável que essas obras sejam deslocadas, do contexto do museu para o museu precário debaixo de uma HLM [habitação social] da rua Albinet. Elas se confrontam assim com a realidade do tempo de hoje de novo. Isso pode ser uma reatualização, a obra deve, e vai, eu estou seguro, afirmar a sua força transformadora em um contexto não museo-patrimonial.”
Thomas Hirschhorn, trechos da nota de intenções do Museu Precário Albinet, grifos do artista. (In: Musée Précaire Albinet, p. février 2003.)

“Tentar aplicar o potencial transformador da atividade artística para a reconstrução de tecidos sociais comprometidos pela marginalidade não é uma utopia distante. À medida que a pessoa se envolve com o processo, ela se transforma. (...) Vi isto acontecer diversas vezes, como consequencia da valorização do indivíduo e do seu universo simbólico inerentes ao trabalho; além, é claro do ambiente nestas regiões tornarem-se imensamente mais agradáveis, menos agressivos, menos desumanos.”
Mônica Nador (in: Mônica Nador, Paredes Pinturas, p. 20-21.)

“Mas será a arte um campo apto a transformar contextos? (...) Nessa difícil fronteira atuam muitos artistas convidados para a 27ª Bienal, com projetos que pretendem ir além do que vem sendo chamado de “arena de trocas” e “espaços de encontros”. Envolvem comunidades socialmente desfavorecidas, que vivem a violência urbana. Os resultados surgem em pequena escala, mas são efetivos na saída do estado de menoridade graças a uma atuação do imaginário pelo coletivo.”
Lisette Lagnado (in: Lisette Lagnado e Adriano Pedrosa (orgs), 27ª Bienal de São Paulo - Como Viver Junto, p.57)

Trabalho disponível em: http://issuu.com/bertaoliveira6/docs/museu_prec__rio_albinet_thomas_hirs

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