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secao 4!

revivendo o devaneio -

experimentos na percepcao da arquitetura

flavio raffaelli fonseca

giselle beiguelman

Trabalho que engloba teoria e projeto. Ambos se tornaram ferramentas importantes para o desenvolvimento final que culminou em experimentos didáticos de formação criativa, realizados em outubro de 2013. Ao final, o resultado obtido na ultima experiência, transforma-se num impulsionador de novas idéias, relacionadas a arte, ao ensino e a arquitetura.

Qual relação podemos criar a partir do corpo da arquitetura e o ser humanó Estudos vêm apontando ao longo do tempo relações entre o corpo humano e a percepção, pensamento e consciência. Tudo isso articulado pelos sentidos, vinculados no processamento das respostas sensoriais.

"Uma prova significativa de que pessoas criadas em diferentes culturas vivem em mundos perceptuais diferentes está em seu modo de orientar-se no espaço, de mover-se e ir de um lugar para o outro." Antigamente notava-se com mais facilidade a experiência descrita acima por Edward T. Hall (1966:69), antropólogo que estudou o comportamento sensorial humano. O mundo se compondo em suas relações de "aldeia global" gera uma normatização destes mundos perceptuais.

Diversos textos descrevem numerosas culturas que possuíam uma indiferença entre a visão, audição, olfato, tato e paladar. Todos tinham importância coletiva no comportamento e na comunicação. Hall ainda diz que um ponto muito importante que devemos considerar é que o homem atual está excluído para sempre da plena experiência dos vários mundos sensoriais de seus antepassados, pois estavam integrados e profundamente implantados e organizados em contextos que só podiam ser compreendidos por pessoas daquela época.

Ele ainda diz que, nossa capacidade como homem contemporâneo se resume em "algo de nossas próprias reações sobre a índole e organização de nossos próprios sistemas visuais e de nossas expectativas; algumas noções do que pode ter sido o mundo perceptual primitivo". Porém ele sempre afirma que nosso conhecimento sempre será incompleto e baseado em uma realidade imagética.

Na renascença, o sistema dos sentidos era relacionado ao senso da visão do corpo cósmico; visão era relacionada ao fogo e luz, ouvir ao ar, cheiros ao vapor, gosto à água, toque a terra. Os cinco sentidos formavam uma linha hierárquica que ia do maior, a visão, ao menor, o toque. (PALLASMAA.2008:33)

Maurice Merleau-Ponty(1971), principal pensador fenomenológico cita em seus textos relações que artistas tem com a criação e a percepção em suas obras. Para ele vemos a profundidade, a velocidade, a maciez e a dureza dos objetos. Diz ainda que Cézanne captava até mesmo os cheiros.

"Se um pintor deseja expressar o mundo, seu sistema de cores deve gerar um complexo indivisível de impressões, em outro caso suas pinturas acertam possibilidades sem produzir a unidade, presença e a intransponível diversidade que governa a experiência e que é a definição de realidade para nós." (MERLEAU-PONTY.1962)

A cidade contemporânea perdeu seu eco, afirma Pallasmaa (2005). A importância da intimidade entre acústica e percepção também é discutida em seus textos: "Os espaços abertos e amplos das ruas contemporâneas não devolvem os sons, e nos interiores as edificações atuais os ecos são absorvidos e censurados. A música gravada e programada que toca em shoppings centers e espaços públicos elimina a possibilidade de palparmos o volume acústico de seus espaços. Nossos ouvidos foram cegados."

Somente através da arte é que se mostrou viável seu desenvolvimento. Assim como Schulz afirma, a arte é uma maneira de se obter respostas intangíveis ao conhecimento técnico, e necessárias para a compreensão de nossos estímulos vitais. Viver este trabalho, durante um ano, valeu-se da profunda compreensão de valores abafados pela rotina (do desenho livre a espiritualidade), impulsionar os momentos criativos, alçar vôo a imaginação, propor uma mudança.

O sentir, ao longo do tempo, foi deixando de ser múltiplo, tornando-se mais padronizado, como afirma Hall. Retomando a minha questão inicial, sobre como seria projetar um ambiente desarmonioso, acredito que hoje em dia é isso o que mais fazemos. Desconsideramos fortemente nossa identidade sensorial, em aprazia a um senso comum que na verdade não existe. Talvez o domínio excessivo da visão tenha nos cegado, e como arquiteto, desconsiderar o resultado estético de seu projeto, fez me valer de outros impulsos. Algo intrínseco de nossa formação, os sentimentos humanos.

"Meti a cara em vários terreiros, me coloquei muito tempo de pai-de-santo, a ioga procurando acompanhar os meus mortos sumidos e consumidos com as guerras do mundo. Acho que pus os pés no fundo, onde está Sáo Pedro, mas morri de medo embora ache tudo divino e maravilho. Encontrei meu transe tranzido de pavor. E vi, juro que vi, embora tenha esquecido, coisas táo estranhas que, ao voltar para o lado de cá, estranhei muito o meu mundo, que nunca tinha encarado bem de frente. Acho que fiquei louco, ou loucos sáo todos aqueles que se dizem normais. Durante algum tempo, fiquei recolhido, pintando o que sentia e aos poucos fui sendo trazido de volta ao convívio dos mortais, iguais a mim, bem comportadamente representando seus pequenos papéis no teatro do mundo. Procuro me orientar o melhor possível entre meus pares, fingindo náo ver óbvio e sentindo cada vez mais próximo o limite provável da insensatez." (IMPéRIO, 1983, p.47)

Império se mostrou um verdadeiro guia das sensações e resultantes deste processo. Partir de seu alicerce filosófico, para mim, foi algo extremamente necessário, que impulsionou a vontade de desenvolver este projeto, mesmo sabendo dos riscos que envolvem a discussão das sensações, principalmente no mundo acadêmico. Flavio acreditava não ser ele o orientador metodológico, e sim nós mesmos, que através da nossa busca pessoal, encontraríamos as nossas respostas. Dizia que seu papel era somente de juntar as pessoas com interesses em comum, através da arte e sensibilização; e que fazendo isso, a força motriz da criação já seria impulsionada.

Este trabalho é uma tentativa de abordagem teórica, experimental fotográfica, tentativas artísticas e, acima de tudo, investigativo. Na busca em ligar o prático ao teórico, pelo viés da percepção, se nota uma falta de clareza direta do porque desta proposta, mas somente através da dúvida é que nos sentimos permeados pela discussão, não como expectadores, mas seres humanos que dominam seus próprios sentimentos e reações ao mundo externo.

"Uma abordagem introspectiva da arte geralmente causa suspeita porque se acredita que ela carece de objetividade. Mas as pessoas parecem não exigir o mesmo tipo de objetividade da obra criativa do artista. Uma obra de arte é uma realidade somente quando se tem uma experiência dela e ter uma experiência de uma obra de arte significa recriar sua dimensão de sentimento."(PALLASMAA. 2008:485)

Trabalho disponível em: http://issuu.com/flavioraffaelli/docs/revivendo_o_devaneio

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