Procurei identificar manifestações sensíveis desses desequilíbrios apontados; manifestações como a pixação e as reminiscências e apropriações dos tradicionais bairros de imigrantes (que inclusive vem sofrendo profundas transformações com as novas ondas migratórias). Minha preocupação era fazer o registro visual dessa dinâmica, ou melhor, tentar compreende-la a partir dessas manifestações imagéticas, sensíveis. A pesquisa continuou em busca de registros históricos que alimentassem essa percepção paisagística do espírito visual da cidade, portador de todas suas contradições. Se há algo constante nessa cidade é esse caráter de movimento e transformação contínua, determinada por seu esforço produtivo.
Captar de forma contemporânea esses fragmentos, surpreendentemente criadores de uma unidade, foi o primeiro desafio. Depois de buscar alguns eixos de leitura em que essa unidade fosse representada na sua fragmentação, me dei conta que as questões de mobilidade conforme elas tem se apresentado nos últimos anos constroem uma nova linha narrativa que apresentava a cidade de uma forma nunca antes possível. A partir daí comecei a percorrer com insistência as marginais, o rodanel e os trechos suburbanos da rede ferroviária, procurando captar a nova estrutura visual dessa nova narrativa. Surpreendia desde o início como outras espacialidades conhecidas e decorrentes de outras lógicas (núcleos históricos, expansão especulativa, grandes conjuntos habitacionais etc) ressurgiam com enquadramentos e conexões antes insuspeitáveis. Essa percepção foi o impulso para a procura de uma nova forma de representação dessa realidade e suas lógicas.
O produto final deste trabalho é uma vídeo instalação com 4 telas simultâneas, produzida a partir de imagens captadas nesses eixos de circulação urbana. Como se pudéssemos entrar nessa “caixa” formada pelas 4 vistas da cidade, a vídeo instalação permitirá o visitante olhar simultaneamente “todas” as diferentes faces da cidade. Como se estivéssemos em um local alto e distante o suficiente para que dominássemos todo o território que se apresenta, mas diferentemente da perspectiva aérea que teríamos se estivéssemos neses local hipotético, a instalação criada proporcionará ao visitante uma visão POV (point of view) dos diferentes extremos da cidade, semelhante à que vivenciamos diariamente, mas dessa vez somadas e simultâneas.
4 telas foram instaladas no ambiente da FAU, cada qual apresentando simultaneamente a imagem de uma das vistas filmadas. Com a ajuda dos softwares de edição Modul8 e MadMapper, 4 projetores foram instalados em sincronia, mapeando exatamente a dimensão total de cada uma dessas telas. Os vídeos de cada uma das vistas será primeiramente editado de maneira independente, com recursos técnicos capazes de evidenciar seu “ponto”, logo, um imenso vídeo com as dimensões das 4 telas somadas foi editado, para que dessa maneira se tivesse controle sobre a instalação como um todo.
Longe de “carimbar” essa cidade como um ambiente hostil e caótico, fadado eternamente a crises urbanas, (apesar do conteúdo escrito desse trabalho poder eventualmente ter interpretações desse gênero), a instalação audiovisual produzida é a tentativa de tradução da complexidade das paisagens e processos que constroem nossa cidade. Sem qualquer tipo de juízo de valor maniqueísta simplificado, a instalação tem caráter muito mais sensorial que técnico informativo e permite diferentes análises e percepções.
