logofau
logocatfg
secao 4!

Desenho percurso paisagem

Julia Sayeg Tranchesi

Luis Antônio Jorge

Este trabalho se constitui em uma série de desenhos elaborados a partir de andanças pela metrópole de São Paulo. Os desenhos foram produzidos em diferentes momentos e formatos. Realizei ao todo nove caminhadas, que foram registradas em um mesmo caderno de desenhos. Alguns destes desenhos foram escolhidos para serem reelaborados em folhas soltas de maiores dimensões.

O trabalho todo se delineia a partir de dois pontos de partida: o desejo de me embrenhar por territórios desconhecidos de São Paulo - de me pôr em movimento, de conhecer novos lugares, situaões urbanas, formas de viver a cidade - e a vontade de desenhar - de me colocar como sujeito que atua sobre a cidade, que a olha e a interpreta.

As caminhadas por São Paulo, a princípio, tinham o objetivo de auxiliar na construção de uma narrativa totalizante de metrópole: a ideia era construir um discurso sobre ela tendo como fundamento seus lugares desconhecidos - como fonte de pesquisa - e o desenho - como linguagem de representação e apreensão do território. Esperava encontrar através da experiência da cidade elementos para a construção dessa narrativa.

No entanto, essa busca por um discurso verbal aos poucos se perdeu e as caminhadas se afirmaram simplesmente como experiências, como momentos de viver a cidade, observá-la e desenhá-la. O trabalho tomou forma enquanto processo de experimentação gráfica e visual, e a cidade e as caminhadas sobre ela comearam a aparecer mais fortemente enquanto motivo para o desenho.

A narrativa que foi construída é sobretudo visual e diz respeito ao processo de constituição dessa linguagem. O modo de olhar, de se apropriar do espao também se desenvolveu durante este processo e isso transparece nos desenhos. A cidade está presente nas imagens, e estas falam daquela, mas não sob a ótica de um discurso unívoco elaborado verbalmente.

Esta série de desenhos se configura como processo e produto final deste trabalho final de graduação. Produto final porque as imagens construídas são o resultado de um trabalho de pesquisa. Processo porque cada novo desenho - assim como cada nova caminhada - trouxe novas questões relativas à forma de olhar e representar, questões que foram aprofundadas e/ou discutidas nos desenhos e caminhadas posteriores.

Assim como uma investigação do espao da cidade, na qual o desenho de observação e o caminhar se estabelecem como ferramentas, há uma pesquisa gráfica em desenvolvimento. Os primeiros desenhos realizados no momento das caminhadas foram revisitados em dimensões maiores, com novos materiais, traos e formas. Com a mudança de escalas, questões novas de linguagem entraram em jogo, e a primeira impressão da cidade foi retrabalhada, o olhar foi selecionado e deixado a fazer novas descobertas.

Referências como Anselm Kiefer e Vincent Van Gogh foram essenciais para uma abordagem menos objetiva e mais expressiva das paisagens retratadas. Especialmente a partir do contato com suas obras e de incursões na pintura, os desenhos que antes apresentavam um caráter fortemente de registro topográfico da cidade se dramatizaram e foram imbuídos de conteœdo expressivo. Imagens de paisagens de São Paulo - em oposição a cenas ou detalhes da vida urbana - ganharam espao dentro do trabalho, paisagens estas que foram carregadas emocionalmente.

O conjunto de desenhos revela uma cidade genérica, com poucos pontos de referência que a poderiam definir como São Paulo. As vistas representadas não são claramente reconhecíveis. O desenho da linha de alta tensão elaborada a partir de caminhada pela represa Billings na Zona Sul, por exemplo, poderia estar se referindo a qualquer outro linhão de São Paulo ou de outras cidades. O mesmo acontece em outros desenhos: a vista sobre o rio, o paredão de prédios, os trilhos do trem, o viaduto em construção - todas imagens sem referências precisas de sua localização.

Os territórios caminhados foram escolhidos por razões diversas: aproximar-me das águas da cidade, conhecer o antigo bairro operário onde minha avó nasceu, caminhar pelos extremos da metrópole. Não foram escolhidos, apesar da intenção inicial, a partir da ideia de construção de uma imagem global da metrópole, mas sim a partir de interesses diversos, muitas vezes pessoais. Talvez, esteja aí a origem da aparência de cidade genérica revelada pelos desenhos. O que importa neles é o retrato de certas paisagens e cenas descobertas durante as caminhadas, e não tanto a relevância destas para a representação da metrópole como um todo.

As pequenas paisagens se revelam a partir da experiência de cidade. Paisagens que não são cartões postais ou pinturas históricas, mas cenas ordinárias do cotidiano da metrópole.

Através das caminhadas, o corpo se faz presente no espao: vive a cidade, a olha, a sente de perto. E cria imagens concretas - e não construções abstratas - a partir da vivência de alguns de seus muitos espaos banais.

O olho à procura de elementos para o desenho encontra a cada instante uma paisagem a ser observada, sobre a qual se debruar atentamente. As pontes sobre os rios, os postes de iluminação, os trilhos de trem, as pessoas amontoadas nas estações. A cidade se apresenta como espao infinito de referências, fonte inesgotável de ideias, assim como o campo de estudos do desenho. São tantos os caminhos para percorrer, paisagens para observar, desenhar. Materiais, traos, formas, grafismos a experimentar, histórias a contar.

A cidade está aí, suas paisagens e personagens, apresentando-se ininterruptamente à visão. O sujeito atuante a vê e investiga com o olhar que apenas a ele pertence, que parece encontrar naquilo que observa elementos para a sua própria reflexão.

slideshow image

If you can see this, then your browser cannot display the slideshow text.

 

topo