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Brasilidades Noturnas:

Fotografia da Paisagem Urbana como Expressão Artística Contemporânea

Marcelo Pagotto Figueiredo (Marcelo Scarpis)

Artur Simões Rozestraten

APRESENTAÇÃO

O desafio de captar registros da paisagem urbana em horários específicos com pouca luz, frequentemente com longas exposições, contrasta a atuação do fotógrafo com a de todas as pessoas que diariamente passam apressadas pelas vias da cidade. Ao contrário de criar uma receita, este trabalho pretende ser um livro experimental de fotografia, a percorrer os limites do imaginário e da realidade. Definido o recurso principal, foi identificado o tema que despertava mais interesse. Meus gostos pessoais e apreço à paisagem urbana e ao patrimônio histórico nacional apontavam a fotografia noturna das cidades como o assunto mais interessante a explorar neste momento, ainda mais instigante em circunstâncias desafiadoras. Havia muitas opções e muitas formas de expressão na fotografia que estava igualmente disposto a explorar. A fotografia noturna era apenas uma delas. Definido o recorte temático, era necessário complementar minha produção. Após o primeiro semestre de concepção do projeto fotográfico, planejei viagens para desenvolvê-lo e diversificar o panorama de imagens que compus do Brasil.

O PROJETO

Brasilidades Noturnas começou com a exploração da fotografia à noite em grandes cidades. Cada viagem foi planejada cuidadosamente em função das datas e horários apropriados. Fatores como luminosidade natural, artificial e eventuais permissões e horários de visitação foram levados em conta.

Uma maneira de explorar a plasticidade de imagens já muito conhecidas sob a luz do sol é redescobrí-las à noite. Em outros casos, o que surpreende é encontrar outras, inéditas. O projeto então evoluiu para uma releitura noturna de imagens do Brasil. O processo fotográfico foi acompanhado pelo desenvolvimento da curadoria, que apontou associações interessantes entre núcleos temáticos e pares unidos ora por oposição, ora por semelhança.

Quase não há pessoas nas fotografias. Pelo menos não diretamente. Não há retratos, pessoas com identidades reveladas. Paradoxalmente, as mesmas trazem milhares de pessoas consigo. Do lado externo, as salas das casas e apartamentos estão com luzes acesas como para compor imagens de alto contraste, às vezes reduzidas a uma abstração. Em outras fotografias há detalhes de arquiteturas, também sem presença humana, mas que foram observadas por viajantes ao longo de décadas ou séculos. Do lado interno, as janelas estão abertas para contemplar a noite, de onde são discretamente fotografadas. Pequeninas diante da imensidão das cidades, parecem detalhes de maquetes. Cenas das montanhas do Rio de Janeiro, da torre de Brasília, do alto dos prédios de São Paulo fazem do leitor um viajante. A bordo deste trabalho, o leitor é convidado a flanar pelas cidades brasileiras, às vezes separadas por milhares de quilômetros.

CURADORIA

A capa do trabalho abre a temática brasileira a partir da capital do país, com uma das primeiras imagens feitas. A sequência de fotografias inicia com um passeio pelo litoral até atingir grandes centros urbanos, cenas da cidade, ora deserta, ora pulsante, seguida de elementos significativos da paisagem, que resplandecem e se reinventam com o cair da noite, até chegar à arquitetura e finalmente ao detalhe arquitetônico, sintético e conceitual. O núcleo central do conjunto certamente é a fotografia da grande metrópole, nem sempre identificável sem legenda explícita. A proposta inicial do projeto era de fotografias de capitais brasileiras exclusivamente. Ao longo das viagens, por terra em sua maioria, percebi que havia muitas outras cidades que proporcionavam imagens interessantes à noite. Não pude me furtar de tirá-las, pois havia possibilidade de incluí-las. Percebi que o projeto curatorial do livro tinha flexibilidade suficiente para isso.

Os dois últimos ensaios fotográficos, respectivamente em São Paulo e Rio de Janeiro, coincidentemente sofreram limitações de horário, durante o lusco-fusco. Isso motivou uma nova concessão ao projeto inicial, essencialmente de fotografias da noite totalmente escura. O horário de crepúsculo era mais simples de registrar e ainda oferecia matizes de cor e contraste fundamentais para destacar o relevo montanhoso, sem o qual as fotos do Rio de Janeiro ficariam plasticamente mais fracas. Muitas fotografias foram descartadas pela imprecisão de registro (até então fundamental para mim), algumas vezes ocasionada pelo longo tempo de exposição, frágil a qualquer brisa, tremor ou instabilidade do tripé. Outras foram excluídas ao longo do processo de edição do livro, pois não se encaixavam na proposta. Essa tarefa se mostrou mais complexa do que as etapas precedentes, pois foi a primeira experiência concreta que tive com curadoria.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Comparando as fotografias e considerando as datas, percebi que há fotos melhores que outras. Creio que isso se passa com todos os fotógrafos, na realidade. Felizmente, fiquei mais satisfeito com as últimas. As primeiras nem tanto. Notar isso significa algum progresso técnico ou um amadurecimento crítico. As funções desempenhadas ao todo: concepção de projeto, fotografia, curadoria, tratamento, design gráfico, pré-impressão e ajustes finais, surpreenderam-me pelo volume de tarefas a desempenhar. Foi possível ter noção clara de todas as etapas de um projeto de publicação de fotografia artística. Com base nas referências, constatei que a curadoria de fotografia geralmente abrange obras produzidas durante anos, décadas ou até mesmo a vida profissional inteira de um fotógrafo. Portanto não seria possível atingir neste trabalho o mesmo resultado dos livros que tomei como referência. Esse projeto percorreu boa parte do país, em cidades históricas e arquitetonicamente notáveis. No entanto, lugares significativos como a Bahia e a Região Norte não foram contemplados neste trabalho, que não considero concluído; ao contrário, pretendo expandí-lo. Acredito que um projeto de fotografia sempre possui espaço para ser aprimorado. Nunca se encerra.

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