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secao 4!

Habitar às margens

Tamires Almeida Lima

João Sette Whitaker Ferreira

O trabalho se propôs a compreender a relação entre as ocupações urbanas e as áreas de manancial a fim de elaborar um conjunto de diretrizes que norteasse propostas de intervenão nos assentamentos precários situados nestas áreas.

Por meio da pesquisa histórica e bibliográfica, foi possível tecer conclusões sobre o impacto das urbanizações e dos demais usos que se instalam na região dos mananciais e verificar que a urbanização destes assentamentos deve ser uma dentre diversas medidas a serem tomadas em direção à recuperação das águas e da preservação e ocupação adequada de seu entorno.

A urbanização dos assentamentos precários, frente ao passivo acumulado de cerca de 1,5 milhão de pessoas residindo nas áreas dos mananciais, tornou-se a única soluão viável econômica e socialmente para a requalificação destas regiões, visto a impossibilidade de se deslocar tamanho contingente populacional. Portanto, julgou-se imprescindível a elaboração de um conjunto de diretrizes de intervenão mais específico ao caso das áreas de manancial, baseado-se e somando-se aos desenvolvidos por Bueno (2000), Denaldi (2003) e demais autores, cuja compilação de ideias e metodologias se debruou sobre um contexto mais geral de intervenão em assentamentos precários.

O tema da urbanização de favelas tem ganhado proporções significativas dentro das políticas urbanas nas últimas décadas. De maneira geral, grande parte dos municípios que possuem assentamentos informais em seus territórios, de alguma maneira estão habilitados a realizar este tipo de intervenão. No entanto, o caminho percorrido para que essa possibilidade existisse não foi curto.

Após a Constituição de 1988, que tratou de temas sociais e respondeu a alguns anseios da população que lutara para ser ouvida e se fazer ouvir, novos rumos puderam ser dados a diversas questões sociais, muitas delas estagnadas antes e durante o período do regime militar.

Muitas lutas foram vencidas, mas no ‰mbito da Reforma Urbana, a batalha teve de se estender um pouco mais. Somente em 2001, com a aprovação do Estatuto da Cidade, demos significativos passos em direção à construão de cidades mais justas e democráticas.

Visando regulamentar os artigos 182o e 183o da Constituição, o Estatuto implementa uma série de instrumentos urbanísticos e dá as diretrizes para a criação de tantos outros, capazes de fomentar importantes transformações na nossa sociedade, marcada pela desigualdade social e pela segregação urbana.

No entanto, apesar da importante ferramenta que agora possuímos em mãos, sua utilização ainda é difícil. A tradição patrimonialista do nosso Estado e sua instrumentalização pelas elites (FERREIRA, 2007), impõe severas barreiras à criação e implementação de políticas públicas que surtam real efeito na diminuição das desigualdades e na democratização do acesso à terra, aos servios públicos e, de maneira geral, aos direitos sociais duramente conquistados.

As estruturas sociais e de poder que se articulam no território urbano ditam o ambiente de desigualdade social, urbana e ambiental entre as classes sociais, e ainda que num Estado democrático, muito das estruturas arcaicas de gestão estão baseadas no patrimonialismo, na concentração de renda e de terras, e na segregação espacial entre ricos e pobres.

Dentro deste contexto, o trabalho busca elaborar diretrizes de intervenão na favela Cruzeiro do Sul, em São Bernardo do Campo. Esta comunidade ocupa área particular inserida na APRM (área de proteção e recuperação de mananciais) da represa Billings e tem sofrido pressões para sua remoão, principalmente, devido às condições ambientais de sua localização.

A empresa administradora da represa reclama a retirada dos moradores para que possam realizar manutenão e operação da represa, a existncia de uma nascente e um córrego muito próximos às casas, o fato de estar do lado oposto da estrada que passou a ser o delimitador da ocupação na região, a precariedade habitacional de parte das residncias e a dificuldade de controle urbano para impedir a expansão da comunidade foram fatores somados pelo município que oficializou a remoão da comunidade na elaboração do PLHIS (plano local de habitação de interesse social) visando resolver o conflito.

Conflito este pela apropriação do espao urbano e pelo direito à moradia, que neste caso bate de frente com a visão conservadora que tem sido dada à questão ambiental, à intervenão sobre propriedade particular do terreno e aos poucos avanos feitos em relação à manutenão e controle da expansão urbana sobre áreas ambientalmente frágeis.

No entanto, ainda que o desenho possa ser responsável por mais qualidade urbana e ambiental nos assentamentos e na cidade, no trabalho de pesquisa desenvolvido para este projeto e para os demais dos quais tive a oportunidade de participar, ficou claro que a luta a ser travada antes de colocar o lápis no papel é o maior desafio imposto a nossa sociedade, e não somente aos assentamentos precários, mas em especial a eles.

Desta maneira, o trabalho apresentado visa embasar tecnicamente as soluções discutidas e elaboradas de acordo com os anseios e demandas da comunidade, a fim de se reafirmar que, sim, é possível repensarmos as cidades e seus conflitos de maneira participativa, colaborativa e inclusiva, com respeito ao meio ambiente, mas principalmente, com respeito ao ser humano.

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